20 junho 2012

Sem tenda de campanha na montanha - O Bivaque


Muitos montanheiros libertam-se de muito peso, deixando a tenda em casa. Essa poderá ser uma boa ideia quando nos deslocamos em zonas onde existam refúgios de montanha, cabanas, albergues, cavernas ou outros refúgios naturais.


Mas convém ter presente que a cabana para onde nos dirigimos pode estar cheia de gente que também se lembrou dela, pelo que a solidão e tranquilidade que procurávamos e desejávamos desfrutar, poderá estar cheia de risos, canções e até discussões que perdurarão, provavelmente, até altas horas da noite.


Os montanheiros até podem suportar isso, no entanto este tipo de atmosfera poderá ser encontrado num bar qualquer do nosso bairro, não sendo necessário ir para a montanha para encontrar tal ambiente. Num refúgio ou num albergue não podemos eleger a companhia, e além disso as pousadas e albergues sujeitam-nos a horários e determinadas regras. Teremos que nos cingir a distâncias previamente fixadas para cada dia, porque teremos que estar na pousada ou no albergue até à hora de abertura e voltar correndo para chegar antes que fiquem cheios. Desta forma estamo-nos a privar da liberdade e mobilidade que nos oferece a tenda de campanha.



O melhor do montanhismo é podermos acampar quando estamos cansados ou onde a paisagem for mais agradável, representando esta escolha a verdadeira liberdade. Existe uma alternativa a dormir numa tenda, que é fazer um bivaque. Pode-se improvisar um refúgio simples, mas eficaz, somente com  um saco de plástico grande ou com uma lona impermeabilizada. Nestes refúgios não ficamos tão protegidos da água como numa tenda de campanha, mas este será um pormenor sem importância se considerarmos a diferença de preços (as lonas impermeabilizadas costumam custar a décima parte do preço de uma tenda barata). Utilizar coberturas de bivaque em Gore-Tex será outra alternativa para prescindir da tenda. Ainda que sejam dispendiosas, a sua aceitação tem sido cada vez maior entre os montanheiros  que pretendem aliviar peso na mochila e pretendem dormir ao ar livre. Os sacos de bivaque com aros são na realidade pequenas tendas, funcionais, embora com pouco conforto.



(Se vamos dormir ao ar livre, não nos podemos esquecer de montar um refúgio. Uma simples lona de nylon, sem furos, pode-se colocar de qualquer uma das formas que se mostram nas ilustrações acima. As árvores são os melhores pontos de ancoragem, no entanto também serve um bastão forte. Ao colocar a lona, convém recordar que a entrada do abrigo não deve ficar voltada contra o vento.)


(Na imagem acima vemos um saco de bivaque de Gore-Tex com aros. Como o espaço interior tem pouca altura, o vapor de água que exista dentro do saco, vê-se forçado a saír pelos poros do PTFE, por acção do calor do corpo, desaparecendo por convecção. Estes sacos costumam pesar cerca de 700 gramas, sendo portanto ideais para o montanheiro que pretenda reduzir o peso ao mínimo, evitando ficar sem refúgio impermeável para a noite. Não se pode falar de conforto, pois apenas é possível ficar deitado nesta classe de refúgio.)

(Se pretendemos viajar com pouco peso, será conveniente levar tendas como a da imagem acima, com armação de arcos e um equipamento leve e bem compactado.)


Noites ao ar livre

Existem montanheiros e escaladores muito destemidos que sentem calafrios só de pensar em passar uma noite ao ar livre sem as comodidades materiais de um hotel ou duma pensão, ou pelo menos com as quatro paredes de um simples refúgio de montanha, entre eles e os elementos naturais. Esta é a reacção natural das pessoas - ditas -normais, sociais e domésticas. O montanhismo oferece-nos a possibilidade de quebrar estas restrições sociais, proporcionando uma mudança da rotineira vida diária.  “Identificar-se com a natureza” é uma frase banal e gasta,  que dá a impressão que quem  a diz é um excêntrico. Contudo se dormirmos debaixo de um céu estrelado, sem outra protecção que não seja o fino saco de bivaque a separar-nos entre nós próprios e o mundo exterior, enquanto escutamos os grunhidos abafados de uns veados, quando vemos um esquilo nervoso e curioso que se aproxima do nosso corpo inerte, ou, ainda, quando escutamos o barulho do vento nas árvores que nos rodeiam, jamais como então nos teremos sentido tão próximos da natureza.


Claro que nem toda a gente pensa da mesma forma. Muitas pessoas têm imensa dificuldade em relaxar  se estiverem ao ar livre. Para além da acolhedora luz das suas velas cintilantes ou lanternas, encontra-se um mundo escuro e hostil e sentem uma ameaça que engloba tudo a começar pelas sombras.


O som de qualquer rocegar na vegetação, ou de grunhidos, pode-se ampliar até alcançar proporções alarmantes e o som da água a fluir no ribeiro pode dar a impressão de vozes distantes a murmurar. É preciso ter coragem para ficar dentro das paredes de lona de uma tenda frágil, ouvindo o vento a gemer e rugir sobre a colina próxima, aguardando que nos sacuda com uma força estremecedora.

Mas a experiência é uma grande professora. Quando sabemos que a nossa pequena tenda está firmemente montada e protegida, e que não será arrancada pelo vento, quando sabemos que os esquilos, os guaxinins e os ouriços cacheiros são incapazes de nos fazer mal, quando tristemente tivermos consciência que a simples presença do homem origina medo e alarme em quase todas as criaturas, será nessa altura que saberemos que não existe nada com que nos preocuparmos. O medo do desconhecido é o mais receoso de todos os nossos temores e esse medo pode-se  transformar  rapidamente em amor. O amor à solidão, o amor aos espaços abertos e naturais, o amor ao cheiro da resina dos pinheiros, do café acabado de fazer e da terra húmida e o aroma do novo dia que começa na natureza.
Contudo , a maioria das recordações mais felizes das viagens, são os sítios onde acampamos. As etapas de caminhada das viagens também serão recordadas, mas não passam simplesmente de meios para alcançar um fim, que será passar a noite no exterior, seja debaixo das estrelas ou dentro de uma tenda.


Em muitas ocasiões também se efectuam percursos de apenas um dia. Quando se vive perto das montanhas, pode-se partir a qualquer momento,  passar um dia no cume das montanhas e regressar a casa para jantar, mas sempre falta algo em dias destes, fica sempre um sentimento de nostalgia quando nos afastamos destes maravilhosos sítios enquanto a noite vai caindo. È como se algo de nós ficasse para trás. A melhor forma de estar nas montanhas, por senti-las em toda a sua dimensão, passa por procurar um pequeno pedaço de erva plana para a converter na nossa casa durante uma noite. As melhores partes do dia são sempre as horas do início da manhã e aquelas em que cai a escuridão da noite.


Nas viagens de apenas um dia, estes momentos são perdidos. É muito melhor permanecer na natureza e sentir-nos parte desta,  quando a escuridão se estende sobre nós, passar a noite confortavelmente, resguardados no saco de bivaque ou na tenda, a sós com os nossos pensamentos e sonhos, ou até com um bom livro e pela manhã levantar-nos cedo e frescos. É básico e essencial acampar depois de um dia de caminhada. “Onde deixo o meu chapéu está a minha casa”, esta frase talvez sintetize o romantismo do viajante. Um dos prazeres mais elementares do montanhismo é encontrar um local bonito para acampar e passar a noite. Alguém escreveu um dia, que para conhecer uma montanha é preciso dormir nela. Passar o ciclo completo das 24 horas do dia sujeitos à intempérie, dá-nos uma grande confiança em nós próprios e na nossa capacidade de nos identificarmos com o meio ambiente. Se regressamos a casa ao caír da noite, ou abandonamos o local para ir em busca da comodidade de um hotel, sentimo-nos como meros visitantes.


Muitos consideram os montanheiros muito corajosos, uma vez que conseguem resistir a todas as adversidades que acontecem num acampamento em plena natureza, sobretudo quando a aventura dure vários dias. No entanto amigos, a dureza é algo que está ausente de tudo isto. A única coisa que se necessita para poder disfrutar de um acampamento de vários dias, é de um bom equipamento em que se possa confiar e principalmente saber utiliza-lo. Com o passar dos anos, o equipamento converte-se num velho amigo.




O abrigo (Bivaque)

A situação complica-se quando somos apanhados desprevenidos e precisamos improvisar para conseguir um abrigo minimamente confortável para passarmos a noite.

A função primária de um abrigo é proteger o montanheiro dos perigos e riscos, próprios do ambiente de sobrevivência. Um abrigo bem construído também pode fornecer conforto e bem-estar psicológico. Quanto mais dilatada for a duração da situação de sobrevivência, tanto maior será a importância destas considerações.


Um abrigo feito à mão, pode ir de um rápido e simples alpendre a uma cabana de troncos completamente calafetada. A sofisticação do abrigo que resolvermos fazer depende de vários factores.

As ferramentas à nossa disposição e a circunstância de o abrigo ser temporário ou semipermanente, são factores fundamentais para a nossa decisão. Mesmo que tenhamos previsto uma permanência dilatada, os nossos esforços têm de, necessariamente, limitar-se à construção de um abrigo simples, se, pelo menos não dispusermos, no mínimo, de uma navalha e de um machado. Outras considerações mais significativas são o tempo disponível para trabalhar a madeira e os conhecimentos da arte de o fazer. Contudo de qualquer modo poderá ser construído um abrigo bastante adequado com poucas ou nenhumas ferramentas e um conhecimento limitado das técnicas de trabalhar a madeira. O importante para construir um abrigo eficaz e habitável é improvisar. A improvisação, combinada com a criatividade e os conhecimentos básicos do trabalho com madeira, pode produzir um abrigo robusto e confortável.

Escolha do local

Devemos procurar um sitio seco para acampar, num esporão ou ponto alto do terreno, num local aberto bem afastado de pântanos (mas não demasiado afastados da nossa fonte de água doce). Nessas circunstâncias os mosquitos incomodarão menos, o solo estará mais seco e as brisas serão mais prováveis.

Devemos saber, por exemplo, que na selva montanhosa, as noites são frias. Devemos providenciar protecções contra o vento. Devemos evitar os leitos de rios secos. Estes leitos secos podem ser inundados em poucas horas. Essas enxurradas podem ser provocadas por chuvas caídas em locais tão distantes da nossa posição que tampouco nos aperceberemos do perigo que representam.


Alguns tipos de abrigo

Como já aqui se referiu, o tipo de abrigo a construir depende do tempo disponível para o preparar e de se destinar a servir como estrutura permanente ou semi-permanente. Eis alguns abrigos simples:

1- O abrigo de colmo ou em “A” – Construído cobrindo uma estrutura em forma de “A” com uma boa camada espessa de folhas de palmeira ou outras folhas pesadas, bocados de casca de árvore ou leivas de relva. Põe-se o colmo atado a ripas e coloca-se de baixo para cima. Este tipo de abrigo é considerado ideal desde que possa ser concebido completamente à prova de água.


2- O alpendre – Ou abrigo-padrão. Quando usar um abrigo do tipo alpendre, é, porém, importante que esteja estrategicamente localizado num local onde se possa fazer uma fogueira suficientemente grande para espalhar calor de forma uniforme por todo o abrigo. A localização correcta do alpendre e da fogueira em relação aos ventos dominantes é outro factor a considerar. Este abrigo pode ser melhorado com uma fogueira e com a construção de um reflector com toros verdes colocado para lá da fogueira em relação à abertura do alpendre. Grandes pedras espetadas do outro lado da fogueira também reflectem o calor.


3- O abrigo de salgueiros – Este é construido com salgueiros atados formando uma armação que pode ser coberta por tecido. Não há nenhum desenho especial para este tipo de abrigo, mas deve ser suficientemente espaçoso para um ocupante e seu respectivo equipamento. É muito importante colocar a extremidade aberta do abrigo perpendicularmente aos ventos dominantes, bem como vedar a parte inferior da cobertura com terra ou neve para evitar que o vento entre nele.


4- O abrigo de árvore caída – É, como o nome indica, formado pela copa de uma árvore caída. Os abrigos feitos com as copas das árvores caídas não reflectem o calor de uma fogueira e metem água durante uma chuvada, mas os ramos podem servir como um abrigo temporário.


5- O abrigo de tronco – Este é construido colocando dois barrotes de encontro a um tronco de grandes dimensões e cobrindo a estrutura com folhagem. Este abrigo não é conveniente para ser usado como acampamento permanente.



A cavidade natural

Se não tivermos um abrigo connosco, o que seria preferível, teremos que procurar oportunidades de abrigo que a natureza nos oferece e que já tem previstas para nós, seja uma caverna ou uma cavidade natural no solo. No entanto, devemos evitar depressões naturais em áreas de baixa altitude uma vez que podem inundar e se estivermos numa ladeira, temos que tentar manter-nos  bem longe de buracos expostos e propícios para escoamento de águas.

Uma cavidade pode ser demasiado rasa para nos sentarmos dentro dela , mas ainda assim pode servir de abrigo contra o vento, se nos  deitarmos  nela, e se a dotarmos dum telhado básico podemos  ainda mantê-la seca também.

Alguns pontos a ter em consideração para um correcto aproveitamento de uma cavidade:

1 - Se a cavidade não for suficientemente  profunda para nos abrigar da acção do vento , será necessário remover alguma terra  com uma vara, que poderá ser um pau afiado na ponta para soltar a terra que depois será removida.

. Convém analisar com cuidado o solo que não deve ser  húmido, pois  pode ser propenso a inundações.

. Se o terreno for muito difícil de escavar, pode-se colocar pedras ou madeira  para construir os lados aumentando-os, evitando, assim, a necessidade de escavar.

. Deve-se colocar material no chão para fazer uma cama antes de continuar



2 - Com uma serra, ou, na falta dela, com alguma improvisação, corte um bom número de paus resistentes ou galhos que sejam suficientemente compridos para cobrir todo o buraco e  que servirão para criar um teto de apoio. Cortar um tronco mais espesso, que deve ser apoiado em cima dos paus transversais. Com este procedimento irá criar a altura e a inclinação semelhante a um telhado inclinado. Certifique-se que a estrutura não é demasiado pesada.



3 - Coloque ramos mais curtos, paus, ou postes ao longo do topo do tronco e ramos para criar um telhado pontiagudo.

Devem unir-se estes materiais bem juntos e certificar de que estão colocados firmemente na posição



4 - Deixar uma entrada numa extremidade do abrigo com espaço suficiente para entrar e sair sem danificar o telhado.

. Garantir que a entrada não fica de frente para o vento, sendo que um ângulo de 90 graus em relação ao vento dominante será o ideal.

. Isolar o telhado inclinado com folhagem, usando tantas folhas  quanto seja possível.

. Iniciar a camada de isolamento final, trabalhando-se sempre dos lados para a parte superior do telhado para assim criar uma sobreposição de folhas de forma que  a água da chuva escorra para fora do buraco.

. Em condições húmidas colocar um poncho ou um plástico por cima.



Tenda Bivaque pequena

Um saco de bivaque consiste numa capa leve à prova de água usado para cobrir um para saco cama e é feito de um material respirável que reduz a condensação. É um componente essencial  para  campismo e montanhismo  podendo facilmente ser transformada numa tenda pequena para uma única pessoa. A vantagem de fazer uma tenda de saco de bivaque,  é que, em condições de chuva, a água cai pelo lado e não penetra para o interior tão rapidamente como acontece quando o saco fica estendido plano no solo.

Procedimento:

1. Estende-se o saco de bivaque no chão no local escolhido para o montar.

. Se tiver a aba da capa em cima ela vai formar uma "porta" que trava para baixo. No entanto, se a aba está no fundo pode ser amarrado como uma porta.

. Anexar um laço-botão (mais abaixo explicaremos como se faz este tipo de laço) com uma laçada em  cada uma das esquinas  do fundo do saco bivaque.

. Estacam-se os laços com um laço-botão no chão.


2. Atar a um laço-botão, com um longo comprimento de cordél para o centro da abertura do saco bivaque de forma a  segurá-la.

. Puxa-se para baixo os lados direito e esquerdo da entrada e coloca-se um laço-botão com uma laçada, no sítio onde eles se encontram no chão.

. Prende-se os laços-botão  no chão.



3. Coloca-se uma vara curva (ou duas varas cruzadas) sobre o fundo do saco bivaque.

. Prende-se o laço-botão que tem 45 cm, dos pés do saco bivaque  para o aro. para assim o levantar e proporcionar mais espaço para os nossos pés.

. Estaca-se fortemente o cabo a partir do aro.


4. Corta-se um pau com a mesma altura da entrada (também podem ser usados um rebento curvo,  ou varas cruzadas)

. Coloca-se o pau na entrada, passa-se o cabo-botão pelo meio e por cima deste, e estaca-se a corda levemente.

. Reajustam-se todos os pinos para garantir um bom aperto e uma boa tensão.



5 . Quando quisermos entrar na tenda bivaque, basta remover o o pau da abertura e nela introduzir primeiro os pés.

. Com este movimento é necessário certificar que a corda não fique presa a nós.


6. Depois de termos entrado na tenda bivaque, recoloca-se o pau da entrada  sob o cabo longo.

. Usa-se o capuz do saco bivaque como uma porta ao abrir e fechar, se for necessário.



Como se faz  um laço botão

Os laços-botão proporcionam uma fixação simples e segura para segurar ponchos e lonas que não possuem laços ou ilhoses,  tornando fácil e seguro  anexar uma linha ou cordel. Como não tem que se cortar buracos no material, continuará a ser à prova d'água e menos propenso a rasgar.

1. Embrulha-se uma pequena pedra, redonda e lisa (ou similar) no material para formar um "botão". Depois prepara-se a corda, e ata-se com um nó corrediço numa  extremidade.


2. Coloca-se a argola aberta do nó deslizante sobre o pescoço do botão e puxa-se para o  apertar.


3. Na outra extremidade da corda  faz-se  uma laçada simples para prender às cavilhas do seu abrigo



A neve como refúgio

Não há nenhum problema em passar a noite debaixo de uma lona ou de um saco plástico, ou simplesmente debaixo das estrelas, no entanto saír no Inverno para a montanha sem uma tenda de campanha é procurar seguramente complicações. Apesar de tudo, podemos perfeitamente saír sem tenda, quando esteja um tempo invernal, se o fazemos com a deliberada intenção de escavar um buraco ou uma caverna na neve para aí bivacar enquanto estivermos na montanha.

São bem conhecidas as propriedades isolantes da neve. Os cientistas da Universidade do Colorado compararam a capacidade isolante da neve com a do saco cama. Em ambos os casos o agente isolante consiste em milhões de minúsculas bolsas de ar. No saco cama, estas bolsas de ar formam-se entre as partículas das penas e na neve ocorre o mesmo ao amontoarem-se e unirem-se entre si os flocos de neve. Algumas aves pequenas como as perdizes e mamíferos como as lebres azuis, são capazes de sobreviver em invernos de muita neve, protegendo-se do vento ao abrigo de buracos e montes de neve.

Uma camada de neve recente pode conter entre 60 a 90% de ar, dependendo da sua estrutura. Após ter estado algum tempo no solo a forma dos flocos de neve transformam-se, as arestas e as pontas desaparecem e o que eram bonitos flocos convertem-se em massas globulares, mas grande parte do ar original permanece na neve. A neve que caiu há mais tempo não retém tanto ar , mas este está firmemente preso, com o que aumentam as qualidades isolantes da neve.

Se escavarmos um buraco neste tipo de neve sólida, conseguiremos um isolamento parecido com o que obteríamos se nos enfiássemos num saco cama. A temperatura que mantém o ar retido com a temperatura média com que caiu a neve, mas rapidamente o calor do corpo, das velas e dos fogões, originam uma mudança notável da temperatura dentro do covil de neve. Devido à acção destas fontes de calor, a temperatura do ar dentro da caverna de neve começa a elevar-se até ao ponto de congelação. Será conveniente manter a temperatura abaixo de 0º dentro do covil, para evitar que se formem goteiras caso a neve  comece a derreter . Talvez não pareça muito atractivo estar num ambiente a 0º C, mas essa situação será muito melhor do que uma caverna de neve com uma temperatura mais elevada, mas com a neve a escorrer e a gotejar. Se quisermos apreciar o relativo conforto que nos oferece uma temperatura de 0º, podemos experimentar colocar o nariz fora do covil e deixar-nos ser fustigados pelo vento por breves momentos. Ao comparar a brisa e frio do exterior com a temperatura do interior, parecerá que o nosso covil de neve é um apartamento com aquecimento central. Se quisermos fazer um bom trabalho na construção de uma caverna de neve, será útil dispor de uma pá larga, ou melhor ainda, uma serra para a neve. Muito poucos montanheiros levam consigo estas ferramentas, a não ser que vão com a intenção premeditada de construir um covil escavado na neve. Neste caso, estas ferramentas facilitam-nos a tarefa. Os montanheiros utilizam normalmente os piolets, os testos das panelas, os esquis, os bastões, as mãos,  os pés e qualquer outra coisa que possa servir para construir um refúgio de emergência na neve.


Os Iglus

Para construir um autêntico Iglu, é sobretudo necessário muito tempo, bem como a ajuda de uma pá e uma serra para a neve. Uma vez feito, realmente, oferece um refúgio sólido e de estrutura segura, que ficará de pé por muito tempo, inclusive em épocas do degelo. Para construir um Iglu, o requesito principal é que a neve tenha a consistência adequada. É ideal a neve recente, que ainda não teve tempo de se consolidar, se a esmagarmos e deixarmos que fique endurecida, mas é necessário imenso tempo para fazer isto. Podem-se fazer grandes bolas de neve húmida e depois cortá-las em forma de blocos. No entanto qualquer Iglu, mesmo que seja pequeno, precisará de quantidade significativa de bolas de neve, e este é um trabalho duro de realizar. A neve ideal será a que esteja bastante dura ao ponto de nos colocarmos em cima dela e esta resista ao nosso peso sem estarmos com raquetes ou esquis nos pés. A neve deverá ter a mesma consistência em todas as partes do bloco e não apenas na superfície.


Como construir um Iglu

 Escolhe-se um local afastado de qualquer ladeira com risco de avalanche. Para se construir um iglú firme em pouco tempo é precisa muita experiência, uma serra para gelo e uma pá adequada para neve. Ou seja, os iglus não são refúgios de emergência idealizados para, por exemplo, nos proteger de uma tempestade de neve.

1 – Traça-se um circulo em volta do qual se escava uma vala rasa. O tamanho do iglú é decidido em função das pessoas que vão dormir nele. Geralmente, com 3 metros de diâmetro serão suficientes para albergar duas ou três pessoas. Enquanto uma pessoa se dedica a cortar blocos de 40x80x25cm de espessura, as outras duas pessoas podem ir construindo o iglú. Os blocos ganharão consistência e serão mais fáceis de manejar se forem colocados sobre uma das suas bordas, esperando um bocado para que se congelem.


2 – Uma pessoa coloca-se dentro do circulo, para ir colocando os blocos, inclinados para dentro e seguindo a circunferência, em forma de espiral.


3 – Continua-se a colocar blocos até chegar acima, sem esquecer de lhes dar uma certa inclinação para dentro do iglú.

4 – Coloca-se o último bloco, a pedra angular do tecto, com muita suavidade, e abre-se uma porta, do lado protegido do vento para que não fique coberta pela neve.


5 – Pavimenta-se as paredes, cobrindo-as com neve para tapar as fendas.
6 – Por fim, constrói-se um pequeno túnel de entrada e faz-se um par de buracos de ventilação no tecto.  Já dentro do iglú é permitido o lucho de construir plataformas para dormir, ou preparar um espaço para cozinhar, dependendo da nossa vontade.



Viver "dentro" da neve

È fundamental dormir num saco cama que não esteja húmido e com roupas secas. É a única forma de permanecer aquecido toda a noite. Se o saco cama ou a roupa começarem a humedecer, existirão muitas probabilidades  de acabarmos congelados. Logo que entremos no refúgio de neve, é fundamental tirar  toda a roupa que esteja molhada e metê-la num saco de plástico ou na mochila e de seguida devemos enfiar-nos imediatamente no saco cama.

Escavar um refúgio na neve é uma tarefa muito dura que nos faz suar imenso. Antes de começarmos a cavar, devemos tirar  alguma roupa, de forma a ficarmos apenas com o mínimo de roupa necessária para nos proteger, e assim molharmos a menor quantidade possível de roupa com o nosso próprio suor.

É preciso verificar que a cabana ou Iglu fiquem com a ventilação necessária. Se não o fizéssemos poderíamos morrer de anoxia, ou seja, falta de oxigénio. Devemos colocar tudo dentro do refúgio, especialmente os utensílios para cavar. É muito provável que a entrada fique coberta de neve e evidentemente vamos querer saír. Se tivermos que abandonar o refúgio durante algum tempo, será necessário sinaliza-lo bem, para depois o conseguirmos encontrar novamente, e devemos deixar as ferramentas para cavar fora do refúgio. Provavelmente necessitaremos de voltar a abrir a entrada. Convém colocar as botas e a roupa na plataforma onde dormimos podendo-se metê-las na mochila para serem utilizadas como almofada, mas nunca se devem deixar no solo, porque podem ficar coladas com o gelo. Devemos sacudir toda a neve que esteja na roupa quando entrarmos no refugio, tal como se fosse uma tenda. Se não o fizermos, a neve derreterá  ao entrar em contacto com a temperatura interior  do refúgio de neve.  Será necessário prescindir da comida que tenha necessidade de ser fervida durante muito tempo. O vapor de água que sai da panela, produzirá condensação e molhará os sacos cama e a roupa. No covil será ideal usar uma vela em vez de uma lanterna. Com uma só vela podemos iluminar todo o refugio, porque os milhões de cristais de neve vão reflectir a luz, dando assim o aspecto de estarmos na cabana do Pai Natal.

É preciso garantir bastante isolamento entre a neve e o saco cama. Nunca se deve dormir directamente sobre um saco de plástico, porque é bem provável que o saco escorregue e caia da plataforma durante a noite. Se tivermos que sair do refugio durante a noite, deveremos deixar acesa uma luz, que provavelmente, será o único sinal que teremos para nos indicar onde fica o refúgio. Também é aconselhável assinalar a parte superior do refúgio com algum indicativo, inclusive durante o dia.


Tipos de abrigo para a neve


O Covil de neve 

Para se fazer um covil de neve, escolhe-se um banco de neve alto e profundo

1 – Escava-se um buraco e afastam-se os blocos de neve com a ajuda de um saco de plástico.


2 – Quando se estiver dentro do buraco começa-se a ampliar o covil e a escavar umas plataformas para dormir, de forma que fiquem acima do nível da entrada (o ar frio desce e o ar quente sobe).


3 – Com os blocos que tiramos do buraco e posteriormente deixamos congelar, taparemos a entrada do abrigo, deixando apenas uma abertura, suficientemente grande como para passar por ele arrastando-nos. Uma vez dentro da cova, espetamos o piolet ou o bastão na parte de cima da entrada para fazer um buraco de ventilação. Não devemos esquecer de deixar algo que identifique o covil por cima da entrada.


O interior do covil de neve pode ter diversas disposições, variando em função do número de pessoas, do espaço disponível, do gosto, etc. Nunca devemos esquecer os furos de ventilação e que devemos ficar sempre num patamar situado acima do nível da entrada.






Trincheira ou vala de neve

Consiste num abrigo temporário que permite ao sobrevivente ter tempo suficiente para construir um outro de carácter mais permanente. Deve-se procurar uma galeria de neve com pelo menos 1 metro de profundidade e cortam-se blocos de maneira a formar uma vala com a largura de um saco cama e com comprimento suficiente para o acomodar (figura A). Constrói-se uma parede com blocos em torno da vala (figura B) e cobre-se com grandes lajes (escavam-se um pouco no interior de maneira a formarem um arco). Não esquecer também neste caso o buraco de ventilação. O abrigo Trincheira ou Vala de neve não deve ser utilizado a longo prazo





trincheira combatente

Se a neve é macia, uma trincheira de combate é rápido e fácil de construir. Numa emergência, pode-se até mesmo fazer uma trincheira chutando a neve macia. Primeiro, encontra-se um local protegido contra os elementos. Em seguida, testa-se a profundidade da neve com o bastão ou um pau.

1. Usando uma pá ou panela, ou simplesmente chutando a neve, limpa-se uma vala que seja grande o suficiente para uma pessoa  e seu equipamento.

. Deixar pelo menos profundidade suficiente para se poder rolar durante o sono sem estragar o tecto.


2. Criar uma estrutura de ramos e galhos em toda a trincheira, para fazer uma cama, antes de começar a fazer o tecto.

. Verificar se temos material de cobertura suficiente em cima, para impedir a neve de penetrar no interior.



3. Se tivermos uma folha de abrigo ou de lona, devemos coloca-la em cima do"telhado"  para criar uma camada isolante extra.

. Alternativamente podem-se usar esses materiais para cobrir a nossa “cama”.


4. Cobrir o quadro com pelo menos 12 cm (30 cm) de neve para agir como isolamento.

. Deve-se cavar um pequeno buraco na entrada, para facilitar o acesso ao interior do abrigo.

. Na entrada pode-se fazer um pequeno fogo controlado .



Cova-abrigo apoiada numa árvore

Escolhe-se uma árvore grande que tenha ramos grossos e baixos e que esteja cercada por um alto monte de neve. Aumenta-se a cova natural formada pela neve em torno da árvore. Faz-se um telhado com troncos cortados e ramos  e forram-se as paredes e o chão com os mesmos materiais. Este é um abrigo temporário que se pode usar abaixo da linha de árvores. Quando se fizer este abrigo, é importante não deixar caír a neve que se encontra nos ramos.



Em termos de conclusão, não podemos deixar de sublinhar a necessidade de procurar um refúgio em situações de emergência.

De forma a isolar-nos das condições exteriores desfavoráveis, é fundamental saber aproveitar ao máximo as condições naturais do terreno em que estamos a desenvolver a nossa actividade. Qualquer refúgio por precário que seja é bem melhor do que a intempérie. O principal motivo para obtermos um refúgio deriva da necessidade de evitar ao máximo e na medida do possível  o vento, o frio e a humidade, para não perdermos calor e evitar chegar a situações de hipotermia e/ou de congelações.

Haverá que ter em atenção que o calor corporal perde-se de várias formas:

a) Por convecção – (movimento dentro de um fluido) A pele aquece o ar que está em contacto com ela, ao soltar-se este ar por efeito do vento, esta perda de calor acelera (Chill factor).

b) Por radiação -  A emissão de energia em forma de radiação de infravermelhos desde o corpo para o meio ambiente.

c) Por evaporação – A perda de calor que se produz quer na pele pela evaporação do suor (na transformação de líquido em vapor), bem como nos pulmões através do vapor de água da respiração.

d) Por condução – Perda de calor pelo contacto directo com o ambiente, rochas, neve, água, etc.
Assim é necessário tentar reduzir estas perdas de calor mediante a adopção de um refúgio e protecção adequados, para o que deve ter em atençãomais algumas regras:

. Evitar a exposição ao vento, pois este é o maior agente agravante do frio.

. Evitar a humidade, pois o esfriamento é 20 a 30 vezes mais rápido na água do que no ar seco.

. Isolar o corpo do contacto directo com sítios frios, para evitar a perda de calor por condução.

. Utilizar todos os meios disponíveis, para nos abrigarmos, para reflectir o calor na nossa direcção e evitar a humidade (com o recurso a manta de alumínio, roupa, mochilas, cordas, esquis).

Para optimizarmos o nosso abrigo, devemos ainda saber que:

. No fundo dos vales e junto aos rios é mais frio do que nas colinas.

. O ar quente pesa menos e portanto sobe, e ao contrário, o ar frio (mais pesado) desce para as zonas mais baixas.

. A neve tem propriedades isolantes, tanto no que respeita à temperatura exterior como aos ruídos (vento).

. Se tivermos uma fonte de calor, podemos aumentar o seu rendimento reflectindo  o seu calor através de uma folha de alumínio ou similar e situando-a no meio do refúgio.

. O refúgio, ainda que seja confortável, deve ser pequeno para que o volume de ar ao aquecer não seja excessivo.



Esperemos que nunca necessitem de utilizar estas técnicas em situações de emergência. No entanto após lerem este artigo, com certeza que se alguma adversidade ocorrer na montanha, alguma ideia surgirá para desenrascar a situação.

Por último, deixamos aqui mais algumas ideias de abrigos de emergência que dispensam mais palavras.


Boas caminhadas
























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