30 maio 2012

SACOS CAMA ou SACOS DE DORMIR



Quando nos arrastamos à noite para o interior da tenda e deslizamos dentro do saco, introduzimo-nos noutro mundo. Podemos criar o nosso próprio microclima independente das condições climatéricas do exterior, estamos seguros e abrigados e encontramo-nos física e mentalmente separados , não apenas do mundo exterior, como também dos nossos companheiros. O sono abraça-nos. Mas isso apenas sucede se estivermos abrigados e confortáveis.
De noite encontramo-nos praticamente indefesos. Ao longo de um dia normal somos capazes de suportar uma quantidade enorme de situações, chuva, neve, nevoeiro, vento ou sol abrasador. Podemos esgotar fisicamente toda a nossa energia corporal, podemos  não comer nem beber em quantidades adequadas, maltratar cruelmente o corpo e ainda assim sermos capazes de sorrir. Sabemos que umas semanas depois olhamos para trás e consideramos essas experiências do ponto de vista da rotina diária e desejaremos voltar a estar ali, ao ar livre, aceitando tudo o que a natureza nos oferece. Mas à noite o incómodo não se consegue aceitar com boa cara, a humidade e o frio não se toleram de bom grado durante a noite, quando o sono nos deveria invadir relaxando os nossos músculos doridos. As noites sem dormir fazem-nos perder tudo, inclusive a ilusão, e sem esta, a vontade de permanecer ao ar livre dissipa-se como o vapor de um bule.
Felizmente, o homem desenvolveu diversos e magníficos materiais que lhe permitem manter-se abrigado, mesmo nos ambientes menos acolhedores e assombrosamente com um peso e volume diminutos. Os montanheiros no  Ártico ou no Evereste envolvem-se numa espécie de casulo de nylon e penas de ganso que pesa menos de 2 quilos. Podemos defender-nos do Inverno com um pacote que pesa menos de um quilo e não é maior que um naco de pão, o qual se converte no nosso amigo mais intimo.



Mas como pode manter-nos abrigados um pacote leve de penas e nylon quando as temperaturas baixam abaixo de 0º? Isto deve-se ao facto de o ser humano constantemente produzir calor, como um radiador que não se apaga,  e para se sentir confortável, deve perder calor ao mesmo ritmo que o produz, chamando-se a isto equilíbrio energético. Durante um dia muito activo, este equilíbrio consegue-se tirando roupa se estiver demasiado calor ou vestindo roupa se estiver demasiado frio. De noite, quando pretendemos dormir, estamos inactivos e não produzimos muito calor, mas o pouco que se produz é fundamental e deve ser capturado por algum tipo de barreira isolante, o saco cama constitui uma barreira muito boa.

A principal função de um saco cama é manter a temperatura corporal, ao conseguir que o calor não se perca mais depressa do que se gera. O corpo também expulsa vapor de água, cuja eliminação se deve permitir para evitar que se condense no interior do saco, mantendo assim um certo conforto.



O melhor isolamento é o ar quente, seco e imóvel, mas devido a questões práticas é impossível conseguir  um invólucro de ar. O que é necessário então, é um meio que prenda o ar, que permita que seja aquecido pelo nosso calor corporal e evitar que se mova, para evitar assim o seu esfriamento por convecção. Convém ainda ter presente que o isolante deve pesar pouco e deve-se comprimir tão bem  de forma que não se torne um incómodo.

Os preenchimentos

Tanto as penas como a pelúcia sintética e os preenchimentos sintéticos, como o Polarguard, Hollowfil e o Quallofil, são excelentes isolantes. Quando estes preenchimentos  são usados em sacos bem desenhados, não proporcionam apenas uma capa espessa constituída por mais de 95 por cento por ar, como mantém esse mesmo ar imóvel.



As Plumas

Em condições secas, as plumas são indiscutivelmente o melhor isolante do mundo para um saco cama, e nada do inventado pelo homem possui as suas qualidades de duração, compressibilidade e volume. Devido a estas qualidades é capaz de manter uma pessoa agasalhada, com um peso e um volume menores que qualquer outro isolante.

As penas de ancião, é o melhor preenchimento para sacos cama que se conhece, mas infelizmente é quase impossível de obter desde 1940.

As penas de ganso, São o melhor isolante que existe actualmente. Como na sua maioria é proveniente da China e o mercado flutua imenso. O montanheiro normal, que não pretenda gastar demasiado dinheiro no seu equipamento, verá este equipamento como exorbitantemente dispendioso, no entanto, com ele obtém-se uns sacos cama excelentes, pois proporcionam maior espessura estendidos e menor volume dobrados, do que qualquer outro material. A melhor qualidade existente no mercado tem aproximadamente 95 por cento de penas e não menos que 85 por cento em qualquer ponto, estando constituído o resto do preenchimento por pequenas penas encrespadas que não se podem separar das penas principais.

As penas de pato, As de melhor qualidade são apenas ligeiramente inferiores às de ganso. São mais fáceis de encontrar e a gama de qualidade é muito mais ampla. O melhor é o novo, mas por vezes este encontra-se misturado com penas recicladas, limpas e usadas. Estes preenchimentos são mais baratos, mas inferiores a qualquer tipo de preenchimento novo.

Misturas de penas de pato, As melhores contém apenas 50 por cento de penas e além disso, a qualidade das penas varia de forma significativa. O isolamento é inferior ao das penas puras e o peso aumenta. Estas misturas costumam aparecer nos tipos mais baratos de sacos, mas em menor quantidade do que anteriormente, devido ao facto de a maioria dos fabricantes usarem actualmente fibras sintéticas.



A pelúcia sintética

O uso de pelúcia sintética para os sacos cama e sobretudo nos forros dos sacos, popularizou-se imenso nos últimos anos. Esta pelúcia tem algumas propriedades únicas, pois é muito agradável ao tacto, é quente para a sua espessura e não tem rival em condições húmidas. É também boa isolante debaixo da roupa e tem longa vida. Infelizmente estes sacos cama são pesados e muito volumosos e para conseguir diminuir estas características, os fabricantes confeccionam-os com formas muito estreitas, o que provoca uma certa claustrofobia dormir dentro deles. Mais êxito têm os forros leves de pelúcia sintética para os sacos, que se podem usar sozinhos nas noites temperadas de verão, ou com outro saco no inverno, de forma a combater as noites mais frias.



As fibras sintéticas

A maioria são fibras de poliéster de diferentes qualidades. Os enchimentos mais populares da actualidade são o Polarguard, o Hollowfil e o Quallofil, mas nenhum deles, digam o que disserem os comerciantes, atingem nem metade do calor que atinge o de penas, e no entanto todos eles pesam mais e são mais volumosos que estes últimos. Têm a vantagem que não perdem praticamente nenhuma das suas qualidades isolantes em condições húmidas, ao contrário do de penas que se encharca e fica inutilizado.



Até à pouco tempo, quase todos os enchimentos de êxito comercial se produziam em forma de blocos de material, mas actualmente apareceu o enchimento sintético injectado que oferece certas vantagens reais.

O enchimento em forma de blocos, Este método implica a montagem de fibras, geralmente curtas, até atingir uma  determinada largura e espessura e uma posterior pulverização com uma resina para manter a forma obtida. O bloco cobre-se depois dos dois lados com um tecido apropriado e costura-se, obtendo-se uma espécie de sandwich acolchoada. Para os modelos mais leves usa-se geralmente uma camada apenas, que pode originar pontos frios, o que se combate colocando duas camadas contrapostas. A maior vantagem deste método é a estabilidade de enchimento pois não se pode mover. As principais desvantagens são o peso e o facto de que por muito elástico que seja o enchimento, não pode alcançar um volume superior aos limites estabelecidos pela costura mais próxima.

Os sacos injectados, Nestes sacos cama usa-se o sistema de compartimentos com costuras rectas ou diagonais para conseguir uma optima distribuição e volume semelhante aos sacos de penas. Não existem pontos frios, como nos sacos acolchoados de uma só camada e pesam menos que os de camadas. Os compartimentos podem estar distribuídos ao comprimento ou à largura, será melhor à largura, pois assim reduz-se o espaço disponível para o movimento do enchimento. Com este tipo de construção deve-se procurar que exista suficiente enchimento no saco de forma a eliminar qualquer tendência de deslocamento  nos compartimentos. Por esse motivo, este método é apropriado para os sacos de 3 ou 4 estações.


A – Um típico saco cama leve de verão com fecho sintético. A forma em barril é mais eficaz que a rectangular, mas não tão quente como a de “múmia” completa. O capucho parcial proporciona à cabeça, toda a protecção necessária nas noites de verão.


B – Um saco para 3 estações com forma de múmia e capucho completo. Tem a maioria das características de um saco de inverno, menos o enchimento e os pés, que é mais simples. Um fecho lateral que percorre toda a longitude do saco, permite controlar a ventilação.



C – Saco completo para as 4 estações, construído com as partições inclinadas, capucho completo e pés em forma de caixa que proporciona maior espaço aos pés e melhor isolamento.



D –Um saco para o montanheiro que gosta de dormir ao ar livre, debaixo de uma lona impermeável ou debaixo das estrelas. As paredes são construídas com as partições rectas e têm uma camada adicional de material impermeável à água e ao vento, o que lhe proporciona maior isolamento.


A barreira radiante

Este é um conceito relativamente novo nos sacos cama, e demonstrou-se que pode melhorar o rendimento de um saco com o mesmo peso em cerca de 20 por cento. Na prática, a barreira radiante usa-se para reduzir  em cerca de 20 por cento o peso e o volume do saco, mantendo o mesmo nível de resultados. Isto coloca este tipo de sacos cama no que respeita a peso/volume/calor, entre os de penas e os sintéticos. Além disso os sintéticos, têm a vantagem de funcionar bem em  condições de húmidade. Os resultados obtidos com este tipo de material deve-se ao facto de reter todo o calor que normalmente se perde por radiação, enquanto que os sacos não radiantes, reduzem apenas as percas de calor por convecção e por condução. Assim, a combinação da barreira radiante e o enchimento sintético actuam sobre três mecanismos importantes da perda de calor.




Material para as coberturas

 Estes não devem filtrar, devem ser resistentes, não apodrecer e devem ser leves e permeáveis, para permitir que o vapor de água produzido pelo corpo saia para o exterior. Devem isolar também das correntes de ar e a cobertura interior deve ser agradável ao tacto. Os materiais mais comuns são: 

Nylon de duas onças: é simples, resistente e económico, e ainda possui a maioria das características necessárias para cobrir o saco por dentro e por fora.

Nylon anti rasgo de 2 onças: Parecido com o anterior, mas mais resistente. Bom para coberturas exteriores.

Taftá de nylon de 1,5 onças ou menos: É cómodo e muito leve, serve também para forrar os sacos por dentro.

Algodão: Cómodo mas pesado. Utiliza-se sobretudo para coberturas interiores e necessita de muitos cuidados.

Polyalgodão: Cómodo mas pesado. É mais resistente que o algodão e é indicado para cobrimentos interiores.

Gore-Tex: É um material especial que impermeabiliza completamente o cobrimento externo, permitindo-o respirar. É muito bom para sacos de expedição e para forrar os sacos preenchidos com penas, que podem não oferecer bons resultados se estiverem humedecidos. Usa-se com frequência como uma cobertura separável dos sacos cama.


(à esquerda) Uma camada de ar é a melhor barreira para evitar a perda de calor por condução, no entanto se existir demasiado espaço para o ar, este move-se e as correntes convectivas levam o calor.
(à direita) Se o espaço está preenchido, por exemplo, com penas, este prende o ar e mantem-o o mais imóvel possível.


Características gerais de desenho

O tamanho e a forma: Alguns sacos têm determinados pesos por razões concretas. Por exemplo, os sacos de montanhismo são muito estreitos, pois assim reduz-se ao peso. Geralmente, deverá ser possível colocar o capucho sem que os pés fiquem comprimidos contra o fundo do saco. Devemos lembrar também que dentro do saco deve ter espaço suficiente para uma pessoa conseguir usar roupa adicional. Qualquer espaço extra, além deste, constitui mais peso e menor eficácia térmica.




As costuras

O tamanho das costuras é importante para a longevidade do saco. Deve ter um mínimo de 3 costuras por centímetro e preferivelmente, quatro, tanto em sacos de penas como nos sintéticos. É necessário prestar atenção também às costuras por detrás (costuras soltas) no final das costuras do acolchoado nos sintéticos.


A Construção dos sacos cama

Um saco cama é constituído por duas coberturas de tecido entre as quais se encontra o enchimento. Para manter o enchimento uniformemente distribuído e no seu lugar, costuram-se as coberturas entre si. Portanto o método utilizado ao efectuar as costuras é fundamental no que concerne às qualidades isolantes do saco.


A – Acolchoado simples. Não se deve comprar um saco com um acolchoado simples, pois o enchimento está tão comprimido nas costuras que perde as suas qualidades de prender o ar, sendo o seu valor como isolante praticamente nulo.

B – O acolchoado duplo consiste em unir dois acolchoados simples, contrapondo as costuras de forma que se eliminem os pontos frios que apareciam nas costuras do acolchoado simples. Este tipo de saco pesa o dobro obviamente e dependendo do enchimento, pode chegar a ser demasiado pesado para o montanheiro.

C – Na construção do sistema de compartimentos existem umas partições verticais que formam uma parede entre a cobertura interna e a externa, proporcionando assim uma espessura ao longo de todo o comprimento do saco.

D – A construção com compartimentos de paredes inclinadas pode levar mais enchimento que a de paredes rectas, pelo que é mais aconchegante e também mais dispendiosa. Usa-se principalmente para os sacos de inverno com enchimento de penas.

E – Construção em forma de tubos sobrepostos ou partições em “V”. É muito eficaz, mas pesa demasiado e é muito dispendioso.

F – A construção em blocos sobrepostos elimina o problema dos pontos frios, mas o resultado é um saco bastante pesado.


Escolha do saco cama

É necessário decidir primeiro que tipo de actividade se vai realizar mais vezes e de seguida,  então, decidir o tipo de saco cama que vamos necessitar. Não se deve optar por um saco cama para situações extremas, se realizar este tipo de actividade apenas uma vez por ano. Nestes casos as diferenças podem-se salvar conjugando sacos combinados ou roupa adicional.  Devemos decidir o que mais nos interessa a cada um, peso, volume, comportamento em condições de humidade, longa duração, manutenção fácil ou o preço.



Como obter o melhor rendimento do nosso saco cama

Precisamos pensar como vamos usar o saco de forma a tentar obter os melhores resultados deste. É necessário encontrar um refúgio, é preferível dormir numa tenda ou em qualquer tipo de resguardo que nos proteja do vento. É preciso saber que o peito nu da mãe natureza é um colo muito frio, pelo que será necessário resguardar-nos  de alguma maneira para impedir que se perca todo o calor corporal. A humidade que possa aparecer no saco deve ser secado na primeira oportunidade que se tenha. Este aspecto é particularmente importante com o saco cama de penas. Deve-se lavar o saco cama de vez em quando (uma vez por ano com um uso normal) seguindo cuidadosamente as instruções que venham com o saco. Os sacos de penas e os sintéticos devem-se guardar sem comprimir.


As colchonetes isolantes

Quando caímos no sono pela noite, as partes do saco cama que se encontram por baixo do corpo estão comprimidas, pelo que, entre nós e o solo ficam bastantes penas esmagadas ou algo do enchimento sintético e mais ainda se for nylon muito fino. Um dos segredos para dormir agasalhado é afastar-nos do solo, para o qual é necessário usar uma colchonete ou uma esteira. Existem de 3 tipos básicos; 

de espuma de células abertas,


de espuma com células fechadas


e pneumáticos.


Estas últimas podem ser um problema, pois além de terem uma espessura considerável, o ar preso no seu interior não está imobilizado, sendo assim, o calor corporal aquece o ar da parte superior do colchão, mas este ar aquecido entra em contacto com o solo que está frio, e perde calor.
Além disso as colchonetes pneumáticas podem furar e portanto não são muito fiáveis.


A diferença básica entre as colchonetes de espuma de células abertas e as de células fechadas é que nas segundas as células estão seladas, coisa que não ocorre nas outras. As células abertas podem absorver água, como as esponjas, o que é uma pena já que com este tipo de espuma obtemos uns leitos muito confortáveis, ainda que inchem bastante. A espuma de células fechadas é o mais próximo de um bom isolante do terreno, que existe. Como as células estão seladas, não se absorve água, pelo que estas colchonetes são impermeáveis.  No que respeita ao tamanho, volume e eficácia, estas apresentam os melhores resultados e ainda que alguns montanheiros prefiram utilizar um pedaço de espuma que lhes proteja todo o corpo, à maioria basta uma peça que lhes chegue apenas à cintura. Assim diminui-se um pouco a carga. Pode-se sempre colocar alguma roupa, um impermeável, um blusão ou algo similar, debaixo das pernas e pés para conseguir um certo isolamento, ou inclusive esvaziar a mochila e enfiar pés e pernas dentro desta.


Resta-nos desejar óptimas jornadas bem confortáveis e quentes e para o qual contamos ter ajudado de alguma forma com este artigo.



Boas caminhadas