Auto-resgate e evacuação numa parede
Chama-se auto-resgate a qualquer operação de salvamento
realizada por um encordamento (uma cordada) ou um grupo, para socorrer um
acidentado de uma forma autónoma e portanto, com meios limitados. As técnicas
de auto-resgate mais complexas e comprometedoras são evidentemente as
necessárias para a evacuação de um acidentado numa parede.
Acidente consequência de uma queda
O acidente mais frequente em escalada ou alpinismo, é a
queda, podendo as suas consequências ser tão variadas como as causas que as
produziram. Uma queda, é muitas vezes um incidente sem grande importância,
inclusive em algumas modalidades de escalada faz mesmo parte assídua do “jogo”.
Mas uma queda descontrolada, pode ter sérias consequências para quem a sofre.
Se a queda do primeiro ou do segundo elemento da cordada lhe
provoca lesões, a actuação posterior, após deter a queda, pode ser muito
variável, tudo em função da gravidade das mesmas, dos meios ao dispor e da
situação na parede.
Em termos gerais a devida actuação deverá observar as
seguintes instruções:
. Quando acontece uma queda acidental, a primeira reacção do
assegurador (quem segura o escalador que sofreu a queda), será confirmar o
estado daquele que caiu. Se estiver a uma distância próxima do acidentado, deve
tentar comunicar-se com ele, quer através de gritos, gestos ou visualmente.
. Se aquele estiver consciente deve-se tentar fazer com que
chegue a um local seguro através dos seus próprios meios, se as lesões o
permitirem. Se as lesões impedirem que se desloque, devemos tentar baixá-lo até uma saliência próxima ou até à própria
reunião, de forma que fique suspenso o menor tempo possível. Eventualmente poderá
ser necessário içá-lo até à reunião ou outra saliência que ofereça segurança.
. Num caso extremo e nada desejável, em que o acidentado fica
suspenso na corda e inconsciente e não o conseguimos descer até uma saliência,
a nossa actuação deverá ser rápida, procurando aproximarmo-nos dele para lhe
colocar um arnês de peito (por exemplo, uma cinta em oito) com um autoblocante
(peça metálica para nos fixar a uma corda, ex. Shunt ou Croll) ou um mosquetão
preso à corda, para manter a vítima erguida e o mais confortável possível, até
a conseguirmos baixar, até uma
saliência, o que deve ser feito com o máximo de urgência.
Cinta em oito
Shunt
Croll
. O passo seguinte, será reunirmo-nos com a vítima num lugar
seguro, de forma a poder avaliar as suas lesões e poder prestar-lhe primeiros
socorros.
. Deve-se avaliar a situação com calma e decidir que medidas
de evacuação adoptar, sempre dependendo das consequências do acidente.
Quando o resgate se revela complicado, será preferível
esperar e fazer uma análise fria da situação, do que actuar rápida e
desastradamente.
Para tomar a decisão é preciso avaliar as seguintes variáveis:
. Gravidade das lesões;
. Possibilidades de ajuda exterior;
. Meios que dispomos;
. Número de pessoas disponíveis para ajudar e as suas
capacidades;
. Condições do terreno e distância a percorrer;
. Condições meteorológicas;
. Horas de luz diurna disponível;
. Possíveis perigosos a que nos podemos expor durante a
descida;
. Meios de evacuação quando chegados ao solo.
Não é fácil considerar todos estes factores, no entanto é
indispensável esta visão global para realizar um resgate ordenado e seguro.
Evacuação
Antes de se proceder à evacuação, é necessário esperar que o
acidentado se estabilize, após um curto mas necessário período de descanso,
podendo ele mesmo indicar-nos quando se sente com ânimo para começar. A máxima
preocupação será a de não agravar as lesões do acidentado, apoiando-o sobre as
zonas ilesas do corpo e deixando-o descansar sempre que necessite.
Se a zona do acidente for coberta por resgate aéreo, e o
local onde nos encontramos é acessível a helicópteros, facilmente uma
intervenção de resgate demorará apenas algumas horas. Neste caso, se tivermos
abrigo e a meteorologia seja favorável, não terá lógica movimentarmo-nos com o
acidentado, salvo se as suas lesões o justificarem, como seja, um edema
pulmonar, coma diabético, apendicite ou qualquer outra situação que torne a
permanência no local um risco evidente. Noutras ocasiões é necessário adiar a
evacuação até à chegada de pessoal de resgate treinado (salvo se a ajuda
demorar mais de 24 horas) e com os meios adequados, o que deverá ser o caso
perante situações de feridas graves na cabeça, fracturas do pescoço ou da
coluna vertebral, ataques cardíacos, feridas internas graves, etc. Noutras
situações, como nas feridas graves ou doenças, a evacuação é necessária, mas
não urgente.
Nos resgates em que participam várias pessoas, deve-se, de
comum acordo, obedecer ao teoricamente mais experiente. É muito importante a
disciplina nestes casos para evitar os erros provocados por diversas opiniões.
È necessário levar ao extremo as precauções e não perder a atenção na segurança
pessoal de cada participante no resgate.
Manobras e aparelhos auxiliares
Durante o decorrer de qualquer escalada, por muito simples
que seja, necessitamos ter conhecimento das manobras básicas e imprescindíveis
para a nossa segurança, destacando-se os seguintes aspectos: progressão com
cordas, colocação de seguranças, montagens de reuniões, asseguramentos ao
primeiro e ao segundo e rapel; assim como alguns conhecimentos elementares de
segurança sobre a utilização do material. Quando se tiverem completamente
assimilados estes conhecimentos básicos de iniciação, é importante melhorar a formação
com a aprendizagem e prática de algumas manobras complementares e de uso de
material específico. O controlo destas manobras é acima de tudo, a base das
técnicas de auto-resgate. Qualquer aprendizagem deste tipo deve ser efectuada
com a frequência de cursos de formação credenciados e sob a vigilância de
pessoas experientes, sendo de início treinadas sempre junto ao solo e em zonas
sem qualquer perigo.
Avaliação do politraumatizado na montanha
Geralmente os acidentados em montanha sofrem um politraumatismo.
Um politraumatizado, é um ferido que apresenta no mínimo duas
lesões traumáticas graves com repercussão numa ou em diversas funções vitais.
Existem alguns elementos que se devem tomar em conta para
avaliar o seu estado:
1) Diferentes lesões podem interferir entre si devido ao
risco de serem subestimadas:
. Lesões que isoladas não são perigosas, mas que somadas se
tornam graves, (por exemplo, vários hematomas podem originar uma importante
perda de sangue e consequentemente,
provocar o estado de choque).
. Uma lesão pode ocultar outra (por exemplo, uma lesão
medular pode ocultar uma contratura abdominal que nos faria suspeitar de outra
lesão grave como uma viscera abdominal, baço, fígado, etc).
. Pode-se produzir um agravamento, quando se verifica,
simultaneamente, uma lesão de crâneo e outra de tórax (a lesão do tórax pode
diminuir a quantidade de oxigénio que
chega ao cérebro, agravando a lesão cerebral, e a depressão respiratória
produzida pela lesão cerebral pode piorar a insuficiência respiratória
secundária da lesão toráxica).
2) Em qualquer momento pode falhar o sistema
cardiocirculatório.
3) Geralmente às lesões associam-se outros factores
agravantes:
. Hipotermia.
. Altitude: a partir de 2.500 mts já poderá ser um factor
agravante.
. Dor: origina que o ferido se mova, agravando os focos de
fractura existentes, podendo produzir uma embolia e conduzindo ao estado de
choque.
. Transtornos da coagulação.
. Transtornos metabólicos (acidez metabólica).
. Fadiga e stress.
. Factor tempo: atraso na assistência e evacuação,
meteorologia e condições de acesso.
No caso de o montanheiro possuir conhecimentos de socorrismo
avançado, deve proceder da seguinte forma perante um politraumatizado:
Além de avisar os grupos de resgate, o socorrista realizará a
avaliação clínica inicial.
A avaliação clinica inicial para um politraumatizado em
montanha, realiza-se em duas fases:
. Avaliação funcional e reanimação cardiopulmonar.
. Avaliação inicial das lesões.
Seguidamente a esta avaliação, estabiliza-se o ferido, com a
finalidade de o poder levar para um centro sanitário (posto de saúde), devendo
adptar-se os seguintes procedimentos:
. Ministrar os tratamentos extra-hospitalares urgentes que
não podem ser demorados, sem colocar em perigo de vida o acidentado.
. Aplicar analgesia e a sedação, se for necessário.
. Efectuar o transporte para um centro sanitário.
Busca de montanheiros perdidos
O facto de um montanheiro se perder, não constitui só por si
um acidente, mas pode terminar num desenlace fatal. A busca de pessoas perdidas
deve-se iniciar apenas quando se tiver a certeza que a pessoa está realmente
perdida e necessita de ajuda. Por exemplo, não se deve considerar inicialmente
motivo de alarme o facto de alguns montanheiros não chegarem ao refúgio ou
local previsto à hora em que seria suposto que tal sucedesse, no caso de estes serem
pessoas experientes, com bom equipamento e com a meteorologia favorável, no
entanto se for o caso de uma criança, uma pessoal inexperiente e/ou mal
equipada e sobretudo se a meteorologia não estiver favorável, então será motivo
mais que suficiente para originar uma busca imediata.
A área a bater (inspecionar) será evidentemente maior, quanto
mais numeroso seja o grupo de socorro. A primeira busca deverá realizar-se com
rapidez, e efectua-se uma segunda busca com maior precisão, se esta primeira
for infrutífera. Seja qual for a estratégia adoptada, todos os “buscadores”
devem conhecer e respeitar com exactidão o plano previsto antes de começar a
busca. Assim, deverá ter em atenção os sinais de aviso, lugar e horas de
encontro e as zonas prioritárias de busca. Se o grupo se dividir, todas as
pessoas devem estar em contacto e comunicarem-se através dos meios disponíveis.
O meio ideal de comunicação é o rádio, e na falta deste, devem-se combinar
sinais audíveis e/ou visíveis, como gritos “tiroleses”, assobios, apitos,
sinais com os braços ou lanternas, etc. Os grupos de buscadores devem ser
compostos por duas pessoas no mínimo, mas se tal não for possível, os seus
membros devem permanecer sempre ao alcance visual ou audível uns dos outros.
Evidentemente, que os participantes da busca devem ser
pessoas com conhecimento do terreno “a bater” e possuir o equipamento adequado para
poder efectuar a busca com segurança. Por vezes, várias pessoas oferecem-se
para ajudar na busca, geralmente têm mais “boa vontade” do que conhecimentos,
sendo melhor negar a sua participação do que originar mais perdidos ou
inclusive acidentados.
A actuação prioritária será seguir pelo percurso conhecido ou
suposto percorrer pela pessoa perdida, e uma vez neste, perceber os prováveis
locais de desvio, como saídas falsas ou caminhos secundários. Devem-se procurar
pegadas ou indícios da sua passagem, e, se for encontrado algum vestígio,
deve-se seguir a partir daí, pelo percurso mais provável. Se forem confirmadas
as pegadas do desaparecido, concentra-se a busca nessa zona, comunicando-se aos
restantes grupos a sua localização. É conveniente parar com frequência para
chamar a pessoa perdida e escutar possíveis gritos de pedido de ajuda. Se
houver visibilidade, uns binóculos podem ser de grande ajuda.
Os primeiros socorros, mesmo em regiões inóspitas não são
complicados, mas deve-se ter um bom conhecimento deles para que se possa actuar
rápida e decididamente quando as necessidades surgirem. A rapidez é na maioria
das vezes a chave para a medicina de sobrevivência. Aprende as técnicas,
frequenta um curso de primeiros socorros.
Verás que um pequeno gesto poderá salvar uma vida, e, se não
souberes, e aplicares um gesto errado, poderás retirá-la. “Quando não souberes,
simplesmente não mexas”, esta é uma regra de ouro dos primeiros socorros.
Boas caminhadas… e cada vez em
maior segurança!
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