17 outubro 2012

Atitude comportamental em montanha (parte 3)




- Uma perspectiva -


“curtir” música na montanha

Devido à rápida evolução tecnologica, tem-se desenvolvido aparelhos audíveis de música cada vez mais reduzidos em volume, o que permite o seu fácil transporte para a montanha.





 Infelizmente esta atitude tem os seus inconvenientes, pois quando nos deslocamos para a montanha, e se realmente gostamos dela, devemos desfrutá-la na sua plenitude, seja no silencio,  ou seja nos ruídos naturais. Quando transportamos estes aparelhos nessas incursões, um dos  principais objectivos que é suposto impelir-nos para a montanha, é colocado em dúvida, “o sentirmo-nos parte dela”.





Por outro lado, tenho verificado que existem pessoas a caminhar na montanha com os auriculares colocados nos ouvidos, e por vezes a “curtir” a música de olhos fechados ou a dançar enquanto caminham. Já me têm argumentado que a música “dá pica” para subirem uma pendente ou para efectuarem um longo percurso. Se precisam da música para ter essa motivação, ouso dizer que  estão profundamente equivocados, pois o espírito da montanha, o sussurrar do vento, os ruídos das várias espécies de animais, o murmurar da água a correr num ribeiro, as paisagens maravilhosas e paradisíacas, esses sim, é que são a nossa motivação, a força interior de querer desfrutar do momento. O facto de estarmos a ouvir música, priva-nos destas sensações, e são elas o verdadeiro motor de motivação, o irresistível apelo que nos furta às comodidades urbanas.





Por outro lado, quando vamos à montanha, precisamos de ter todos os sentidos apurados, e por muito que tentem dizer o contrário, o facto de irem a ouvir música provoca uma desconcentração quase total da actividade que estamos a efectuar, além disso,  se for necessário chamar a atenção dessa pessoa, por qualquer motivo, seja para avisar da queda de uma pedra na sua direcção,  ou que vai pisar uma víbora, que um animal está a investir sobre nós, que vai no sentido errado, ou que saiu do trilho, ou, ainda, pedir o seu auxílio para uma situação em que nos lesionemos, etc.,  tudo será em vão, pois simplesmente não nos vão ouvir, ou ouvirão demasiado tarde.





Na minha opinião, quem gosta da montanha não a deveria perturbar com outros ruidos que não lhe sejam naturais. Se querem ouvir música, com certeza que o podem fazer, mas apenas nos momentos de pausa ou de descanso e em que seja escutada apenas pelos próprios,





não impedindo os restantes elementos de desfrutar do “silêncio” da montanha. Mesmo quando vamos descansar, antes de adormecer, existem alguns “montanheiros” que gostam de ouvir um pouco de música para adormecer, será um pouco contraditório este contexto, pois para adormecermos, necessitamos de silêncio e não de barulho. Acredito que em muitos casos possa ser uma forma de abafar os medos dos ruídos nocturnos da montanha. Contudo,  mesmo esses são importantes de escutar, pois avisam-nos sempre e  previamente dos perigos e, se estivermos a “curtir” música apenas daremos conta quando o perigo estiver em cima de nós, podendo ser já demasiado tarde.





Levar o cão para a montanha

Caminhar na montanha com a companhia do nosso cão constitui sempre um enorme prazer para os amantes da natureza e dos próprios cachorros. No entanto, antes de tomarmos a decisão de levá-lo connosco, convém ter em conta certos aspectos importantes, como seja, saber se ele  está preparado fisicamente para a jornada que vamos empreender, ter a noção do uso correcto da trela, evitar situações de perigo com a fauna selvagem e proteger as almofadas das patas do cão constituem alguns desses aspectos essencias.




Planificar um percurso na montanha com o cão representa  sempre uma opção atractiva, mas convém ainda lembrar que na montanha podem-se registar mudanças bruscas de temperatura, surgirem passagens tecnicamente complicadas, bem como  outros imprevistos que convém ter em conta ao planearmos a nossa jornada com o nosso bom companheiro.
Se decidirmos levá-lo para fazer um trajecto de montanha, devemos ter as mesmas precauções com o cão que temos com nós mesmos.




A montanha é um lugar maravilhoso, mas também imprevisível. É conveniente ter presente possíveis desprendimentos de terra, passagens estreitas onde o cachorro pode escorregar ou superfícies pouco aderentes, quer seja devido à humidade, musgo ou gelo. Nestes casos, a trela pode servir para reduzir os possíveis acidentes dos animais.





É recomendável levar o cachorro preso com a trela durante todo o trajecto, principalmente quando não se tem demasiado controle sobre ele.
Também de forma a evitar problemas com outros montanhistas, é conveniente levar sempre o cão  preso com a trela. O percurso pode ser partilhado com outros montanheiros que se podem assustar ao deparar-se com um cachorro solto.
A presença de animais selvagens é frequente em certas zonas naturais, que poderão investir sobre o cachorro ao sentirem-se ameaçados ou assustados pelo ladrar ou simplesmente pela sua presença.





O gado solto também é frequente ser encontrado a pastar. Deve-se evitar que o cachorro invista sobre o gado, pois pode-o tresmalhar dificultando  o trabalho dos pastores e podendo originar a perda de algumas cabeças de gado que, ficando perdidos e isolados tornam-se um alvo fácil para os animais selvagens.
Atravessar uma zona de caça representa um perigo para o cão, sendo  conveniente, nessa situação,  colocar-lhe um colete reflector ou colorido que o torne  facilmente visível à distância, de forma a evitar acidentes desagradáveis.





A fauna selvagem não é a única que pode provocar “um encontro inesperado” com o nosso amigo de quatro patas.  Outros cães no percurso também podem ser perigosos para o nosso cachorro, principalmente os que guardam terrenos, casas e os que não têm dono.
É normal o percurso pela montanha decorrer por locais com terreno abrasivo que pode ferir as almofadas das patas do cachorro. Nem todas as rochas são iguais e algumas podem ferir mais ou menos as almofadas das suas patas e a presença de fragmentos de pedras angulares aumentam esse risco. De forma a evitar que a superfície de apoio das patas do cachorro fiquem machucadas com o terreno, é possível recorrer a  botas caninas, elaboradas com materiais como o neoprene,




 que resiste à caminhada e protege o animal. Também se podem usar cremes de protecção para estas zonas.
É importante também transportar água para o cachorro e uma bolsa de primeiros socorros, que pode servir para o dono e/ou para o cachorro, em caso de necessidade.
O nosso cão é o nosso melhor amigo, temos a obrigação de retribuir na mesma moeda.






Corajosos e heróis na montanha

Quando ainda era muito jovem li uma frase que sempre mantive como lema e que dizia o seguinte:  “o título de herói é sempre atribuído a título póstumo”. Podem-me apelidar do que quiserem, mas nada nem ninguém me tirará a consciência de segurança que sempre tento manter presente quando me desloco para a montanha e que coloco em tudo que faço e que possa acarretar algum grau de risco.





 Lógicamente que existem situações em montanha que nos obrigam a expor-nos ao perigo. O perigo é uma constante na montanha, é real, e pode estar presente em cada passada que damos, então se ele existe, será já suficiente enfrentar a dificuldade de superar esses obstáculos. Não temos a necessidade de ir ao encontro do perigo quando temos hipóteses de o evitar.





Ir para a montanha implica muita responsabilidade seja pela nossa integridade física, pela dos outros, pelo grupo e pela própria montanha em toda a sua plenitude. Conforme vamos subindo montanhas mais altas, os perigos vão aumentando gradualmente, o que implica cuidados redobrados, muita maior concentração e espírito de entreajuda entre o grupo.





Verifico que muitas pessoas que vão pelas primeiras vezes à montanha apresentam variados estados de espírito, desde o receio, à alegria e o que mais me preocupa, sentimentos de euforia que muitas  vezes resvala para o descontrole. Em relação aos receios e aos medos abordaremos esse tema com alguma profundidade num futuro artigo. Porém, o referido estado de euforia é também preocupante na medida em que determina um descanso insuficiente ao corpo na noite anterior ao da ida para a montanha, uma vez que se está demasiado excitado para conseguir dormir ou descansar. Depois quando iniciam a actividade, essa euforia traduz-se num desgaste desnecessário de energias, motivado por diversos factores como seja o ritmo acelerado do coração e da respiração, o falar constante e euforicamente, o rir desmedidamente o caminhar de forma desnecessariamente acelarada, o saltitar desnecessariamente, o desviar-se do trilho para ver algo de diferente, o querer mostrar que é capaz de realizar tudo com facilidade, etc. Esta euforia é propensa a originar acidentes,  que, para além dos danos causados ao próprio, ainda poderá colocar todo o grupo numa situação difícil ou mesmo desesperante. Quando vamos em grupo, temos que o pensar como um todo. Não podem verificar-se atitudes egoístas e individualistas, que geralmente colocam o grupo em alvoroço desagregando-o lentamente e originando situações de discussão e discordância. Na montanha não pode haver lugar para respostas do género, “eu é que sei de mim, se me magoar o problema é meu”, não dependo de ninguém, apenas dependo de mim”, “eu respondo pelos meus actos”, etc, este tipo de espírito demonstra muito individualismo, e uma total ausência do espírito de grupo. 





Deve ser ouvida sempre a voz dos mais experientes do grupo, principalmente no que concerne a segurança. Não temos que demonstrar ou provar nada a ninguém, pois quando isso acontece, geralmente cometemos determinadas loucuras que mais tarde ou mais cedo vão terminar em acidente.  Querer passar de caminhadas montanhas de menor dimensão para as altas montanhas “de um dia para o outro”, apenas demonstra vontade de querer mostrar algo que à priori não se possuirá, ou seja,  resistência, consciência, falta de conhecimento e noção do perigo.





Ir para a alta montanha com a aconselhável e desejável segurança,  requer muito treino, muito estudo, elevado domínio das diversas técnicas, etc. Não basta ter resistência física para se estar pronto para a alta montanha. Este é um pensamento muito errado. Podemos ter muita resistência cá “em baixo”, mas na alta montanha não se trata de uma caminhada de 1 dia. Assim e por exemplo, as condições meteorológicas são diferentes, o ar começa a ficar rarefeito e podemos não reagir bem à altitude. Ir para alta montanha exige muito mais de nós do que se possa imaginar, e lá em cima não existe lugar para dúvidas ou para falhas, a concentração tem que ser permanente, pois a primeira falha, poderá ser a última.





Não podemos esquecer que se atingirmos um cume, apenas os que nos são próximos ligarão ao feito e passamos despercebidos. Mas, se sofrermos um acidente ou perdermos a vida na montanha, seremos motivo de noticiário por vários dias. Será que vale a pena aquele fugaz  momento de sucesso? Provavelmente já cá não estaremos para o saber.





Divirtamo-nos pois em segurança… pois, por paradoxo, só uma atitude séria nos permitirá alcançar a verdadeira diversão!

e…

Boas caminhadas




1 comentário:

  1. Excelente artigo!Concordo e subscrevo na íntegra!!Grandes "dicas", para quem caminha na montanha...:-)Obrigada!!

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