Técnica de glaciar, generalidades
Um glaciar é um rio de gelo que desce lentamente desde as
zonas altas das montanhas, até um vale, sendo alimentado pelos depósitos de
neve que nestas se formam.
Seracs
São grandes blocos instáveis que se originam ao
fragmentar-se o glaciar, devido à pressão de deste a empurrar. Podem ocupar
zonas muito extensas. Juntamente com as fendas, são o elementos mais perigoso
de um glaciar e podem desprender-se deste a qualquer momento do dia ou da
noite. A abordagem de uma zona de seracs deve realizar-se com os respectivos
elementos encordados, com o máximo de atenção e evitando a passagem pelas zonas
de possibilidade de queda.
As recentes mortes na encosta do Monte Maudit, junto ao
Monte Branco, foram provocadas pelo deslizamento de um serac.
Exemplo de um glaciar gretado
Escolha do itinerário
As
possibilidades de travessia de um glaciar dependem de uma série de factores,
como seja, a estação do ano, a quantidade de neve acumulada, o estado da mesma,
temperatura ambiente, hora, etc.
A massa de
gelo tende a deformar-se e a gretar devido às diferenças de velocidade no seu
deslizamento, produzidas pelos desvios de pendentes, estreitamentos ou
obstáculos no terreno.
A
dificuldade para a eleição de um itinerário resulta da impossibilidade de
conhecer de antemão, os obstáculos que se podem encontrar. Nos glaciares mudam
constantemente os acidentes da sua superfície, aparecem constantemente fendas
que antes não existiam e desaparecem outras. É conveniente fazer uma avaliação
prévia, do mesmo, observando o glaciar desde um lugar elevado.
Típico perfil de uma fenda oculta
São
extremamente perigosas as zonas de seracs. Se é obrigatório atravessá-lo,
convém ter muita atenção aos blocos de aspecto instável para evitar dentro do
possível a sua trajectória de caída.
As
depressões estão geralmente menos gretadas que as lombadas. Devem evitar-se as
zonas com muitas fendas, ainda que obrigue a dar uma grande volta para as
evitar, pois mesmo assim, geralmente, acaba
por se ganhar tempo.
Itinerário previsto sobre um glaciar
Composição da cordada
A primeira
norma a levar em conta na movimentação sobre um glaciar coberto por neve, será a
de encordar-se, pois muitas das fendas estarão encobertas pela neve.
A cordada no
glaciar deve ser composta, sempre que seja possível, no mínimo por 3 pessoas, porque no caso da queda
de uma delas numa fenda, existe a possibilidade de a retirar facilmente. A
cordada de dois elementos (desaconselhável) tem mais limitações. É preferível
formar uma cordada de 4 homens, em vez de formar duas cordadas de dois. Não
convém fazer cordadas de mais do que cinco indivíduos, devido aos problemas que
se deparam com a coordenação em movimento.
Procedimento para encordamento
O
encordamento efectua-se normalmente em simples (preso a uma só corda), com
corda de 8,5 ou 9 mm. Quando devido à dificuldade do glaciar, seja necessário o
emprego de técnicas de escalada em gelo, utiliza-se o respectivo material assim
como se passa a usar a corda em dupla (preso em duas cordas).
Todos os
componentes da cordada devem levar algum equipamento de escalada, ou
equipamento que o substitua improvisando e procurando que os encordados das
extremidades fiquem com três ou quatro metros de corda de sobra. Esta sobra de
corda leva-se enrolada debaixo da cobertura da mochila, preparada para uma
fácil e rápida extracção no caso de haver necessidade de montar uma polea
(roldana) ou um sistema de resgate.
O encordamento
Quanto mais numerosa seja a cordada, mais seguro será em
caso de algum incidente. O mínimo ideal de cordada corresponderá a 3 pessoas,
sendo o máximo aconselhável de 5 por cordada. No entanto não raras vezes é
frequente uma cordada ser composta por dois elementos. Nestes casos é
aconselhável deslocarem-se perto de outras cordadas, que sigam o mesmo
itinerário de forma a obter ajuda destes em caso de necessidade.
Encordamento em “N” para duas pessoas
Para esta
situação é necessária uma corda de 40 ou 50 metros. Divide-se a corda em 3
partes e os dois componentes da cordada prendem-se à corda a separados um do
outro a uma distância mínima de 15 metros, situando-se no terço central da
corda. Esta distância de corda entre ambos é muito importante. Um possível choque
será melhor absorvido com mais corda solta e evitará que os dois sejam
arrastados para a mesma fenda, que pode ser de uma largura considerável. Se
cruzarmos terrenos menos perigosos, pode-se encurtar a corda com laçadas na mão
ou ao ombro, para não estorvar.
Os dois
extremos restantes, que serão 2 ou 3 metros mais compridos que o terço central,
são levados por cada um enrolados ao ombro ou colocados na mochila, de forma
que não estorvem, mas que seja fácil de utilizar em caso de necessidade. Esta é
a corda de reserva que servirá para ajudar a socorrer o companheiro caído ou
para puxar o seu equipamento. Se a corda for mais curta e não tiver reserva de
mais que 1/3 para cada um levar recolhida, deve-se respeitar pelo menos a
distância de encordamento. Mesmo que a reserva seja curta, sempre poderá servir
de ajuda em qualquer situação. Outra forma de actuar com a situação anterior, será
actuar de forma a que apenas o último elemento da cordada guarde uma reserva de
segurança de mais de 1/3, pois normalmente será esse quem terá de reter uma
queda do companheiro da frente. O elemento que for na frente, deve prender-se a
uns 3 metros do extremo da corda, de forma que possa utilizar esta pequena
reserva de corda em caso de necessidade, funcionando como estribo, para prender
o equipamento ou realizar auto-bloqueadores.
Encordamento para três pessoas
Numa cordada de 3 pessoas, podemos utilizar uma ou mais
cordas, dependendo do seu comprimento, mas respeitando sempre a distância de 15
metros entre os componentes da cordada. Um prende-se no centro da corda e os
outros perto dos extremos da corda, deixando igualmente uma margem de uns 3
metros de corda como reserva.
Encordamento de mais de 3 pessoas
A distância de encordamento, nestes casos, pode-se reduzir
um pouco (para aproximadamente 10 metros), pois com três pessoas será mais
fácil deter uma queda. O primeiro e o último elemento da cordada, assegurarão
que levam uma reserva de corda de uns 3 metros aproximadamente.
Precauções no sistema de encordamento
É conveniente
prender a corda ao arnês por intermédio de um mosquetão de segurança (ou melhor
dois) e não com o nó convencional. Esta forma pouco ortodoxa tem as suas
vantagens, pois o mais frequente é haver a necessidade de se desatar para
ajudar o companheiro, o que pode ser difícil depois do esticão provocado pela
queda, e mais difícil ainda se a corda estiver molhada. Esta forma de se atar é
excepcional e nunca deve ser usada em escalada convencional.
Normalmente
carregamos uma mochila e esta determina que se eleva o nosso centro de
gravidade. Para podermos ficar suspensos sem haver perigo é necessário levar
também um arnês de peito para combinar com o arnês de cintura. Uma vez atados à
corda, cada pessoa deve colocar um ou dois cordinos com nós autobloqueantes
(prusik ou machard) na corda que vai para o companheiro. Um cordino fica
próximo do arnês, cujo extremo fixa fixo ao arnês por intermédio de um
mosquetão e o segundo (opcional) coloca-se mais afastado de nós e será levado preso
à mão.
Montanheiro encordado para caminhar
sobre um glaciar: 1) corda que vai ao companheiro; 2)
corda de reserva colocada na mochila ou ao ombro. Em cordadas de mais que duas
pessoas esta corda pode ir a outro companheiro.
Nas cordadas
de 3 ou mais pessoas, os que ocupem as posições centrais deverão colocar dois
cordinos autobloqueantes, um em cada uma das cordas, ou pelo menos um na corda
que segue até ao companheiro que o precede. Estes cordinos podem ter várias
utilizações, como, por exemplo, servir de estribos para trepar a corda, no caso
de queda numa fenda, ou para poder tirar
o peso da queda numa ancoragem após
ficarmos detidos. Poderá também servir para nos segurarmos ao longo da corda
depois da queda ou para amortecer com o
braço a possível queda do companheiro (com o autobloqueante que levamos na mão).
Um terceiro cordino pode ser útil, devendo ficar preparado para segurar a
mochila ou para o colocar no peito evitando que caia para trás (isto no caso de
não se levar arnês de peito).
Precauções para avançar encordados por um glaciar
. Ao caminhar por um glaciar, a corda deve estar sempre
tensa e avançar à voz de comando , de forma que se alguém caír, a queda seja o
mais curta possível e portanto, menos perigosa. Se for cumprida esta medida de
segurança, normalmente uma queda não passará de se meter apenas o pé ou parte
do corpo numa fenda.
(Caminha-se com a corda sempre tensa)
. O piolet deve ir preso ao punho e o material de emergência
à mão ou colocado no arnês, como alguns mosquetões, cintas e eventualmente um
pitão de gelo, para eventuais manobras que se venham a revelar necessárias.
Material de emergência recomendável
para caminhar por um glaciar, para cada pessoa: 2 cintas, 2 cordinos, 2
mosquetões, 2 pitões, 1 polea e um bloqueador.
. Para facilitar e agilizar, as possíveis manobras de
salvamento em travessias por glaciares, será interessante dispor de alguma
polea (roldana) e algum bloqueador (shunt ou croll).
. É importante que a pessoa mais experiente em manobras de
resgate não caminhe na frente, pois o que caminha na frente é o que tem mais
probabilidades de ter um “azar”, e o mais experiente será sempre mais útil fora
do que dentro de uma fenda.
. Se a progressão pelo glaciar for inclinada encosta abaixo,
na frente deve ir a pessoa mais leve e no final a pessoa mais pesada,
procedendo-se inversamente quando
ascendemos. Esta precaução é óbvia se não quisermos ser todos arrastados.
. Quando a cordada pára para descansar, convém que o faça
num local seguro, numa ilha rochosa ou junto a uma fenda aberta.
. Na cordada de duas pessoas, caminhando em glaciares
perigosos ou quando a diferença de peso entre os dois é grande, é recomendável
fazer nós grossos na corda (devem ser volumosos para que possam ser
utilizados), sendo o primeiro nó efectuado a uns 3 ou 4 metros do arnês e o outro mais
afastado a uns 2 metros do anterior (no restante da corda podem-se fazer mais
alguns nós). Estes nós ajudarão muito a travar a queda, actuando como calços na
borda da fenda.
Exemplo de colocação de nós na corda
para funcionarem como calços
. A roupa que usamos deverá ser adequada para garantir uma protecção
suficiente e suportar o frio nas profundidades de uma fenda.
Notas:
Na cordada
de três componentes, devemos ir encordados com um nó de oito no arnês,
previamente preso por um mosquetão, lembrando que ao fazê-lo devemos deixar o
mínimo de corda sobrante.
No caso da
cordada de dois, os seus componentes encordam-se no terço central da corda.
Desta forma, a corda sobrante poderá ser utilizada em caso de necessidade, como
corda de auxilio .
Deve-se
transportar um mosquetão auxiliar com material à mão (mosquetões, pitões, etc)
e um piolet martelo se dispusermos de um, assim como o material necessário para
efectuar um resgate em caso de necessidade.
Se for
necessário diminuir a distância de corda entre os membros da cordada, estes
devem fazer as laçadas necessárias, colocando-as ao ombro e atando-as com a
mesma corda através de um nó simples a rematar. A corda que nos une ao companheiro
deverá estar presa ao arnês por intermédio de um “nó lais de guia” em “oito” e
um mosquetão de segurança, desta forma um esticão brusco não poderá apertar as
ditas laçadas no montanheiro, entalando-o e tensionando as laçadas de forma que
não se consigam desprender devido à tensão exercida .
Dois Nós
que se podem fazer para funcionar como calços e que se podem desfazer
facilmente:
Este artigo,
logicamente tem utilidade para todos, mas está especificamente dirigido para o
grupo que se vai deslocar ao Monte Branco, porque esta técnica será utilizada
com toda a certeza nesta actividade do Clube de Montanhismo de Braga.
Boas
caminhadas, com segurança.
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