29 janeiro 2014

Problemas psicológicos nas grandes expedições (1ª parte)




Em 1902,  Edward Wilson, um explorador polar, escreveu o seguinte à sua esposa, “Deus sabe que por vezes estou no limite do que posso suportar, e não existe absolutamente nenhuma escapatória. Eu nunca submeti o meu templo a provas como as que agora suporto um dia atrás do outro.”





Não é necessário passar um inverno inteiro na Antártida para partilhar algumas das frustrações e desconforto, que Wilson retratou à sua esposa. Todas as expedições são ricas em tensões e inevitavelmente causam dificuldades psicológicas que podem representar um dos muitos factores no surgimento de problemas, físicos que surgem inevitavelmente.





Neste artigo vamos abordar alguns passos necessários na fase de planificação que contribuem para a redução dos problemas psicológicos e também abordaremos as dificuldades mais frequentes que podem ocorrer naquelas situações e a melhor maneira de as enfrentar.






Fase de planificação

Para planificar uma grande expedição, é necessário começar essa tarefa cerca de um ano antes de a mesma acontecer. Uma vez determinados os objectivos da expedição, é necessário eleger um chefe definitivo. Preferencialmente, o chefe deve ter experiência  como guia de expedições com características similares à que se vai realizar.





Sabemos que nem sempre isto é possível. O entusiasmo, a maturidade e o trabalho árduo, compensarão a falta de experiência, mas é fundamental ter bem cientes as responsabilidades que implica esta liderança. Existem diferentes tipos de liderança. Os bons chefes sabem compreender as suas próprias forças e fraquezas e não tentam imitar ninguém. A falta de confiança em si próprio costuma originar um autoritarismo excessivo e por conseguinte, ressentimentos por parte dos demais expedicionários.





Os chefes que têm confiança em si próprios, são capazes de aceitar que nem sempre têm razão e escutam atentamente as opiniões dos demais companheiros de expedição, mas, ao mesmo tempo, sabem tomar decisões quando estas são necessárias, ainda que não sejam aceites por todos. Qualquer chefe de expedições deveria ler uma grande quantidade de livros sobre expedições para melhor compreender as tensões que podem ocorrer nestas. É, ainda recomendado ao chefe, estudar previamente, alguma matéria acerca de competências de gestão, antes da partida para a expedição.





O chefe de qualquer expedição, por mais pequena que seja, deve estar consciente de que durante semanas ou meses, a sua vida estará dominada pela expedição, e que a sua preocupação pode ser uma carga para as pessoas que o rodeiam na sua vida do dia-a-dia.







Selecção da equipa adequada

Este é o factor mais importante para determinar o posterior êxito ou fracasso de uma expedição. O chefe deve actuar com firmemente na selecção dos membros constituintes do grupo da expedição. Uma entrevista formal com o chefe contribui para deixar clara a sua autoridade desde o início. Não existem regras simples para escolher a equipa correcta para a expedição.





Não se deve ignorar o instinto, pois por vezes este acerta. No entanto, é conveniente manter presentes alguns princípios:

. Antecedentes. A conduta da pessoa no passado, prediz a conducta no futuro. Portanto, deve-se dar mais importância ao que uma pessoa fez, do que ao que ela diz que vai fazer. È preciso levar em conta a experiência prévia do potencial candidato em expedições ou noutras actividades relacionadas. Convém pedir e colher referências, e, se possível, conversar com as pessoas que as possam dar, pois podem contar pormenores que não colocaram no papel.





. Motivação. O entusiasmo deve ser uma característica fundamental em qualquer candidato. Interessam as pessoas que têm entusiasmo pela vida em geral e não apenas pela expedição em concreto. Deve-se conversar com cada aspirante tentando perceber porque deseja participar na expedição e o que espera dela, o que acha que será mais difícil durante a mesma e o que fará se não for selecionado. Muitos candidatos podem ter razões negativas para escapar da sua vida normal, como por exemplo, deixar um trabalho entediante ou superar a perda de um ente querido. Estas razões não são contraindicações em absoluto, para que alguém seja  selecionado, mas têm que ser analisadas e conversadas com franqueza.





. Personalidade. Se existisse alguém de quem se pudesse dizer que é uma pessoa normal, com certeza que não participaria na expedição. Pelo mesmo motivo, não existe o expedicionário perfeito. As melhores expedições são aquelas em que existe uma mistura de caracteres. Deve-se selecionar pessoas que tenham formas de pensar abertas e amigáveis e que sejam sensíveis aos demais elementos do grupo. A auto-confiança em si mesma é outra característica fundamental, juntamente com a capacidade de admitir as falhas e as fraquezas com um sorriso. Mais do que por um psicólogo qualificado, o perfil psicológico dos expedicionários deve ser avaliado pelo chefe da expedição e pelos demais organizadores desta, com senso comum e compreensão da natureza humana. O que faz falta é um bom equilíbrio psicológico no seio do grupo.





. Saúde mental. Por último é fundamental dar importância aos problemas de saúde mental. Em caso de dúvida não se deve hesitar em pedir um atestado médico ou consultar o médico de família do candidato (com autorização escrita deste). Uma expedição não é um local ideal para um portador de doença mental.



Uma vez feita a selecção final, é conveniente que todos os elementos que vão participar na expedição passem no mínimo um fim-de-semana juntos antes de partirem para a expedição. Isto permitirá iniciar a construção do grupo, o que é fundamental para a expedição.



A selecção do pessoal é apenas um aspecto do conjunto da planificação, ainda que seja um aspecto muito importante. Assim, também é necessário dar atenção a todos os outros aspectos. De forma a minimizar conflitos e ressentimentos, é necessário assegurar que todos os expedicionários possuem equipamento adequado e alimentos de boa qualidade, que sempre são um bom reforço para a moral. No entanto,  mesmo os planos mais bem feitos podem ter que ser mudados no último momento, pelo que é necessário manter uma certa flexibilidade para o imprevisto.





Esperamos ter ido de encontro às vossas pretensões. Na próxima semana continuaremos com este tema, que consideramos da maior importância. Até lá…





Boas caminhadas

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