Hipotermia
A hipotermia acidental define-se como a descida da temperatura central
do corpo até níveis em que as funções musculares e cerebrais deixam de
funcionar adequadamente (abaixo dos 35ºC de temperatura central, medida no
tímpano ou no recto a 10 cm do esfíncter anal, mas
se a temperatura central estiver abaixo dos 24ºC será preferível um
termómetro transesofágico).
Em função da temperatura central, a hipotermia pode-se classificar em
vários graus:
. Hipotermia grau I (35-32ºC): vítima consciente, com calafrios.
. Hipotermia grau II (32-28ºC): vítima com baixo nível de consciência
e sem calafrios.
. Hipotermia grau III (28-24ºC): vítima inconsciente.
. Hipotermia grau IV (24-15ºC): vítima com morte aparente.
. Hipotermia grau V (<15 9="" hipotermia="" irrevers="" morte="" ou="" p="" por="" vel.="">
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O tempo aproximado de sobrevivência em água fria é o seguinte:
. 0ºC: 10 minutos.
. 5ºC: 30 minutos.
. 10ºC: 1,5 hora.
. 15ºC: 6 horas.
Condições que favorecem a hipotermia
. Temperatura fria: uma pessoa enterrada numa avalanche, esfria 3ºC
por cada hora.
. Altitude: a temperatura exterior diminui cerca de 0,5ºC por cada 100
metros de altitude.
. Vento: pode-se multiplicar por 10 o efeito do frio.
. Húmidade: pode-se multiplicar por 14 o efeito do frio.
. Equipamento desapropriado.
. Fadiga.
. Desidratação.
. Fraca ingestão de alimentos energéticos.
. Desconhecimento da hipotermia dos seus sinais, sintomas e
tratamento.
. Ingestão de álcool.
Sinais e sintomas de hipotermia
Quando o corpo começa a esfriar, inicia-se uma fase de “luta” com o
aumento da produção de calor (tremores, etc) e descida da perda de calor
(constrição dos vasos sanguíneos, etc). Por volta dos 33ºC a produção de calor
pára e posteriormente, acabam por falhar os mecanismos que evitam a perda de
calor, automantendo-se a hipotermia à volta dos 30ºC.
Sinais e sintomas de
hipotermia
Hipotermia ligeira (36-37ºC)
. Normal, o individuo pode começar a tremer.
Hipotermia ligeira (35-36ºC)
. Sensação de frio, pele fria, se estiver quente não está hipotérmico.
. Tremores mais intensos, mas ainda os consegue deter voluntariamente.
. Atitude negativa e perda de interesse.
. Perda da coordenação motora devido à restrição do fluxo sanguíneo
periférico, não se conseguem realizar tarefas complexas com as mãos (esquiar,
escalar) mas ainda se consegue caminhar e falar.
Hipotermia Grau I (32-35ºC)
. Tremuras violentas que não se consegue deter voluntariamente.
. Consciente, ainda que possa existir falhas na fala, confusão e
letargia.
. Piora a coordenação muscular.
. Movimentos lentos.
. Se o individuo caminha tropeçando, se não conseguirem dar 30 passos
em linha recta, possivelmente existe hipotermia.
. Conduta irracional. O hipotérmico tira a roupa apesar do frio.
Hipotermia Grau II (30-32ºC)
. A tremura passa, apesar do frio.
. Transtornos de consciência. Apatia, confusão, delírio. Conduta
irracional e incoerente, mas consegue manter a postura e uma certa aparência de
coerência.
. Pele azulada.
. Coordenação muscular muito pobre, não consegue caminhar, coloca-se
em posição fetal para conservar o calor.
. Não se consegue apanhar o pulso radial devido ao colapso vascular. No
entanto ainda se consegue apanhar o pulso carotídeo.
Hipotermia Grau II (28-30ºC)
. Rigidez muscular devido à acumulação de ácido láctico muscular,
originado pela redução do fluxo sanguíneo periférico.
. Semi-inconsciência, esturpor.
. A 32ºC o corpo tenta hibernar, reduzindo o fluxo sanguíneo
periférico e diminuindo a frequência cardíaca e respiratória.
. Possibilidade de fibrilação ventricular (arritmia grave).
. Dilatação pupilar.
. A 30ºC o hipotérmico parece morto, no entanto pode estar vivo. Se
estiver em posição fetal e quando lhe separamos o braço, ele volta à posição
fetal, então está vivo.
Hipotermia Grau III (26-28ºC)
. Inconsciência.
. Respiração e frequência cardíaca erráticas, o pulso carotídeo pode
não ser detectado.
. Pupilas não reactivas.
Hipotermia Grau III (24-28ºC)
. Edema pulmonar, falha cardio-respiratória, fibrilação ventricular,
morte.
. Quando a temperatura central está entre 28-32ºC, a mortalidade ronda
os 21%.
Hipotermia Grau IV (15-24ºC)
. Morte aparente, não se observam sinais vitais, no entanto o tórax é
compressível e os músculos abdominais ainda são depressíveis.
Hipotermia Grau V (inferior a
15ºC ou até 9ºC)
. Morte. Não se observam sinais vitais. Agora o tórax já não é
compressível, nem os músculos abdominais não são depressíveis.
Prevenção
O melhor tratamento para a hipotermia consiste na sua prevenção, com o
uso de roupa seca e estanque, assim como uma adequada hidratação e ingestão de
hidratos de carbono, tomando bebidas quentes e açucaradas.
. A roupa deverá constar de várias camadas que eliminem o suor e
protejam o corpo do vento e das precipitações.
. A camada interior deve eliminar o suor e a humidade, mantendo a pele
seca e retendo o calor, utilizando-se para o efeito, por exemplo camisola de
fibra (polipropileno, thermastat, coolmax, etc).
. A camada exterior deve isolar do vento, neve e chuva, permitindo no
entanto a eliminação do suor (goretex, sympatex, e fibras similares).
. As camadas intermédias devem reter o calor gerado pelo corpo e
permitir a eliminação da humidade (forro polar ou roupa com fibras artificiais
ou duvet).
. Não esquecer alguns pares de luvas. Relativamente às luvas pode-se
adoptar a mesma filosofia das roupa por camadas.
. Convém saber que a lã é um bom isolante e conserva as suas
propriedades, mesmo quando está molhada, enquanto que o algodão perde as suas
qualidades quando fica húmido.
. É conveniente retirar roupa antes de se realizar um exercício
intenso para evitar que esta se molhe de suor, pois este humedece a roupa e
diminui imenso a sua capacidade isolante, ao mesmo tempo que aumenta a perda de
calor ao evaporar-se. Quando se descansa, deve-se vestir roupa seca e protegemo-nos,
sem esperar que o frio surja, porque então será necessário mais calor para
voltar a aquecer o corpo.
. Deve-se usar um gorro de cor clara que proteja tanto do sol como do
frio, já que cerca de 20 ou 30% do calor se perde pela cabeça.
Tratamento
Existem recomendações que se devem sempre ter em conta face a qualquer
grau de hipotermia: prevenir a perda de calor e aquecer gradualmente a vítima
enquanto é transportada para o hospital.
Protecção contra o frio:
. Para evitar um colapso por aquecimento, inicialmente deve-se aquecer
o tronco e não a periferia do corpo, portanto não se deve expor a vítima a
calor extremo. Não se deve aquecer as áreas congeladas até que a temperatura
central do corpo seja de aproximadamente 36ºC.
. Deslocar a vítima para um ambiente quente que proporcione um
isolamento efectivo: habitação com ambiente de 23-30ºC, e saco cama aquecido
previamente por outra pessoa, bem como mantas de salvamento (convém saber que
para proteger do frio deve-se colocar o lado de prata para o corpo e para
proteger do calor deve-se colocar o lado prateado para o exterior), etc. Assim
pode-se ganhar 0,1-0,7ºC por hora, ganho sem o qual, o acidentado permaneceria
demasiado tempo a temperaturas centrais perigosas.
. Isolar a vítima do solo e do vento.
. Agasalhar a vítima com roupa seca e quente. Retirar-lhe a roupa
húmida. Se não houver roupa seca, pode-se espremer a roupa húmida o melhor
possível. Se não houver outra solução para a vítima, que não seja continuar com
a roupa húmida, pode-se cobrir esta com um tecido impermeável para diminuir o
esfriamento por evaporação.
. Colocar sacos de água quente ou sacos produtores de calor tipo Heat
Wave (que mantém a temperatura de 38ºC durante 6 ou 10 horas) na cabeça,
pescoço, axilas, lados do tórax e virilhas e isolar para evitar a perda de
calor. Não se devem colocar as fontes de calor directamente sobre a pele para
não a danificar, pelo que se devem envolver com alguns tecidos. Desta forma
ganha-se 1-4ºC por hora. No entanto existe o risco de produzir colapso por
reaquecimento.
. Os banhos ou duches quentes implicam grande risco de colapso por
aquecimento, por esse motivo apenas são aconselháveis na hipotermia ligeira, quando a vítima está
consciente e a temperatura seja superior a 35ºC.
. Não esquecer de cobrir a cabeça e o pescoço.
. Para prevenir o agravamento da hipotermia durante os resgates, são
utilizados aquecedores de carvão (Heatpeac) com a finalidade de manter a
temperatura corporal. É uma pastilha de carvão que ao acender-se liberta calor.
De seguida coloca-se um pequeno aquecedor dotado de um pequeno ventilador que
distribui o calor por uns tubos de tecido que se colocam em volta do corpo da
vítima.
Hidratação
. Devem dar-se bebidas quentes, açucaradas, se for possível a cada 15
minutos e claro se a vítima conseguir tragar a bebida. Esta medida é importante
quando a evacuação for atrasada.
. Não se deve dar álcool, pois como é um vasodilatador aumenta a perda
periférica de calor.
. Não dar café ou chá, pois como são diuréticos aumentam a
desidratação.
Outras medidas terapêuticas
. Não dar tabaco, pois como é
vasoconstritor, aumenta o risco de congelação.
. Tratar as lesões concomitantes. Se as vítimas tiverem de ser
imobilizadas, deve-se fazê-lo cuidadosamente de forma a não produzir lesões
adicionais nos tecidos congelados.
. Mover com muita suavidade, e se possível em posição horizontal e sem
manipular as extremidades, pois existe um risco importante de colapso por
aquecimento. Quando aquecemos a periferia (pel, mãos, pés), aumenta a
necessidade de oxigénio para estas zonas. A capacidade de bombear do coração,
ao estar deprimida pela hipotermia, não consegue levar todo o sangue bem
oxigenado que se necessita para compensar este aumento do consumo de oxigénio.
Além disso, a dilatação dos vasos sanguíneos periféricos resultante do
aquecimento provoca uma recirculação de sangue frio da periferia para as
vísceras esfriando-as. Isto implica descida da temperatura central do corpo,
que pode originar uma arritmia cardíaca grave (fibrilação ventricular) e,
inclusive, a morte. Por esse motivo, quando se retirar a roupa, deve-se usar de
extremo cuidado, sendo inclusive melhor cortá-la para se remover sem mover
demasiado a vítima.
Contamos com a abordagem deste tema ter contribuído para o enriquecimento
do vosso saber sobre esta matéria, de forma a que vão para a montanha
devidamente preparados para acautelar uma das piores situações com que nela nos
podemos deparar.
Boas caminhadas
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