As lesões
dos tecidos moles são as que não afectam os ossos nem os ligamentos. As mais
comuns em montanha são as contusões, as abrasões, as lacerações e bolhas.
Contusões ou hematomas
As contusões
ou hematomas são lesões provocadas por achatamento que produzem hemorragias nos
tecidos lesados. Costumam ser originadas por golpes directos na superfície da
pele. A hemorragia que se produz debaixo da pele confere-lhes uma cor azulada
(hematoma).
Tratamento:
. Repouso
. Frio local
. compressão
local
. Elevação
do membro com a finalidade de reduzir o inchaço e a dor.
. Pode-se
administrar analgésicos com iboprufeno em doses de 400-600 mg a cada 8-12
horas.
Abrasões, lacerações e feridas que não
requerem sutura
As abrasões
são provocadas por atrito, quando se desprende a camada mais externa da pele.
São frequentes por fricção com a neve ou erva durante as quedas ou a fricção
com uma corda durante o asseguramento.
Com o
desaparecimento da camada superior da pele, ficam expostos numerosos capilares
sanguíneos e a sujidade que penetra na pele aumenta a probabilidade de
infecções, se a ferida não for limpa adequadamente.
Um caso
concreto são as queimaduras na zona das articulações. Não são lesões muito graves
mas são muito irritantes.
As
lacerações são originadas pelo raspar dos tecidos por um objecto pontiagudo ou
cortante, dando à ferida um aspecto de cavidade com extremidades irregulares.
Tratamento
das feridas que não requerem sutura:
. Controlar
a hemorragia
. Evitar a
infecção lavando a ferida a fundo. Convém lembrar que os antissépticos não
compensam uma lavagem negligente. Antes de limpar a ferida, convém lavar bem as
mãos com água e sabão abundantes. Se tivermos luvas esterilizadas, convém usa-las.
A ferida limpa-se com água limpa abundante e sabão líquido. Se tivermos uma
seringa grande, pode-se aplicar jato de água
sobre a ferida de forma a arrastar melhor a sujidade. Se ficar tecido
morto, retira-se com o auxilio de uma pinça ou corta-se com tesoura
esterilizada.
.
Desinfecção com iodopovidona.
. Se a
ferida for pequena e não sangrar e o ambiente for limpo, pode-se deixar ao ar.
. Em caso
contrário pode-se cobrir com uma compressa que se fixa com uma ligadura ou
adesivo. O penso deve ser mudado diariamente para evitar a infecção da ferida.
. Profilaxia
antitetânica se for necessário. Lembrar que após a imunização inicial, deve ser
administrada nova dose a cada 10 anos.
. Nas
queimaduras, depois de limpar e secar, deve-se aplicar uma pomada cicatrizante
e cobrir a zona com compressas para evitar novas roçadelas.
Os sinais de
infecção de uma ferida são os mesmos de qualquer inflamação: dor, calor,
vermelhidão, tumefacção e limitação do movimento. Se a dor não diminuir após 3
dias, a vermelhidão se estender para cima da extremidade, o movimento for
limitado, a febre ser elevada e persistir para além dos 2 a 3 primeiros dias,
os gânglios linfáticos aumentam e tornam-se dolorosos e aparece pus, perante
este quadro deve-se supor que a ferida infeccionou. No caso de a ferida estar
infectada, deve-se abrir para drenar, colocando uma gaze sobre a ferida para
que esta não feche procedendo-se à administração de antibióticos.
Queimaduras por fricção
As
queimaduras por fricção são particularmente perigosas para o alpinista, cujas
cordas podem correr entre as mãos ou à volta das pernas e gerar fricção
suficiente para produzir uma queimadura substancial e uma ferida profunda. A
prevenção é sempre melhor que a cura, e o uso de roupa e luvas adequadas e as
técnicas de alpinismo deviam ajudar a impedir estes ferimentos.
Contudo, se
ocorrerem, o tratamento é o habitual: irrigar e arrefecer (nas montanhas é
geralmente fácil encontrar neve), cobrir e depois avaliar se existem quaisquer
outros ferimentos.
Bolhas
As bolhas
geralmente são originadas pela fricção dos pés com as botas, que necessitam de
consideração especial, não só porque são extremamente comuns mas porque se não
são tratadas e são deixadas em condições anti-higiénicas durante muito tempo,
podem produzir infecções graves.
Prevenção:
As bolhas
anunciar-se-ão ao produzir um notável ponto quente na pele, e é este o momento
em que se deve mudar de calçado ou de meias.
Se houver disponível uma pomada, deve-se aplicar. Depois de a zona ter
sido arrefecida e tratada, pode-se continuar o caminho. Devem-se seguir as
seguintes normas para evitar bolhas:
. Ajustar
correctamente as botas.
. Se
existirem pontos de fricção, é recomendável colocar nestes pontos 3 ou 4
compressas bem ajustadas sem enrugamentos e que excedam amplamente a zona de
fricção.
. Polvilhar
os pés com pó de talco ou aplicar vaselina.
. Utilizar
meias tubulares ou dois pares de meias.
. Mudar de
meias frequentemente.
. Se surgir
dor durante a marcha, sempre que seja possível, será melhor parar e colocar
compressas antes de aparecerem as bolhas.
Tratamento:
Por vezes as
bolhas desenvolvem-se totalmente e, como acontece com as queimaduras, não se
devem rebentar voluntariamente, a não ser que, pela localização, afecte a
mobilidade do montanheiro, neste caso deve-se rebentar usando os cuidados a
seguir descritos.
Quando já
apareceu a bolha, pode-se esvaziar com o auxilio de uma agulha desinfectada,
cobrindo-se de seguida com uma compressa esterilizada, procedendo antes à sua
desinfecção.
. Limpar a
área à volta da bolha (cuidadosamente) usando sabão e água, que pode actuar
como um desinfectante suficientemente bom.
. Agora será
necessário uma agulha ou uma lâmina esterilizadas para lancetar a bolha. A
esterilização pode ser feita emergindo o aço em álcool, fervendo-o durante uns
cinco minutos, ou segurando-o sobre uma chama. Melhor ainda será ter no estojo
de primeiros socorros, agulhas esterilizadas e seladas.
. Perfurar a
bolha numa extremidade, geralmente o seu ponto mais baixo, e deixar o fluido
escoar. Não se deve retirar a pele da bolha, deixa-se no local para proteger a
ferida de infecções.
. cobrir a
ferida e limpar regularmente. Deve-se continuar a verifica-la para o caso de
surgirem infecções e aplicar uma pomada antibiótica se for possível.
Se a pele
que cobre a bolha se desprender, deve-se tratar do caso como se fosse uma
queimadura por fricção com uma compressa não adesiva.
Se for
evitado o roçamento da zona, a cura será rápida. Sempre que possível, deve-se
deixar a bolha a descoberto para que seque e cicatrize rapidamente.
No meio
montanheiro também se utiliza o método de perfurar a bolha com uma agulha
esterilizada onde se colocou previamente uma linha. Fura-se a bolha de um lado
ao outro e retira-se a agulha deixando ficar a atravessar a bolha, a linha que
vai servir de drenante do fluido que se encontra no interior da bolha. Este
método também é eficaz mas no entanto é mais sujeito a infecções provocadas
pela própria linha.
Hematoma subungueal
Um hematoma
subungueal (acumulação de sangue debaixo da unha) pode-se esvaziar através da
unha, com o auxilio da ponta de um clip previamente aquecido numa chama até
ficar com a ponta vermelha em brasa. Este procedimento é indolor, quando
aplicado sem tocar na matriz ungueal ao furar a unha e proporciona um rápido
alívio da dor.
Unhas encravadas
As unhas
encravadas ocorrem quando a extremidade da unha cresce por debaixo do tecido
mole circundante dando lugar a uma dolorosa inflamação e infecção.
Prevenção:
. O calçado
deve ter o comprimento e largura adequados, pois a pressão contínua sobre a
unha pode originar ao seu encravamento.
. As unhas
dos pés devem ser cortadas de forma recta, evitando que as margens laterais
penetrem na pele.
. As
mudanças de meias, arejando e secando os pés eliminam o excesso de humidade
devido ao suor, que é um factor desencadeante desta patologia.
Tratamento:
Para tratar
uma unha encravada, é necessário humedecer, se for possível, o pé em água
quente durante cerca de 20 minutos e quando a unha estiver macia e flexível,
deve-se introduzir uma bolinha de algodão com uma gota de povidona iodada
debaixo da sua extremidade com o auxilio de umas pinças para levantar o tecido
mole. Deve-se repetir este processo até que a unha tenha crescido o suficiente
para poder ser cortada recta.
Corpos estranhos nos olhos
Se uma
partícula estranha entrar num dos olhos, não se deve esfregar. Se a partícula
estiver debaixo da pálpebra superior, agarra-se nas pestanas da pálpebra
superior e puxa-se esta para cima e para fora do contacto com o globo ocular.
Aguenta-se a pálpebra nesta posição até as lágrimas correrem livremente.
Normalmente, as lágrimas arrastarão a partícula para o exterior.
Se as
lágrimas não conseguirem arrastar a partícula para o exterior, pede-se a alguém
que olhe e inspecione o globo ocular e a pálpebra inferior. Quando o objecto
for descoberto, remove-se com a ponta de uma compressa ou de um lenço limpos.
Se o objecto
não se encontrar na pálpebra inferior, deve-se inspecionar a pálpebra superior.
Agarra-se nas pestanas com o polegar e o indicador e coloca-se um pau de
fósforo, uma cotonete ou pequeno raminho sobre a pálpebra. Puxa-se a pálpebra
para cima e sobre o pau de fósforo. Examina-se o interior da pálpebra enquanto
a vítima olha para baixo. Com cuidado, remove-se a partícula com a ponta
humedecida de uma compressa ou um lenço limpos.
Se a
partícula estranha for vidro ou metal ou não puder ser removida pelas técnicas
descritas, tapam-se ambos os olhos da vítima e leva-se para uma instalação de
tratamento médico.
Nota: se
apenas um dos olhos for tapado, a vítima usará o outro olho. Como o movimento
dos olhos é sincronizado, a utilização do olho não afectado pode dar origem a
movimentos do olho afectado, provocando assim a lesões adicionais.
Se um
produto ácido ou irritante entrar para os olhos, estes banham-se imediatamente
com água abundante. Para banhar o olho direito, roda-se a cabeça para o lado
esquerdo e para lavar o olho esquerdo, roda-se a cabeça para o lado direito,
fazendo a água correr sempre do interior do olho para o exterior. Desta forma
evita-se que o produto ácido ou irritante escorra para o outro olho.
Corpos estranhos nos ouvidos e nariz
Nunca tente
remover um corpo estranho dos ouvidos.
Um insecto
pode ser retirado facilmente de um ouvido atraindo-o com um foco luminoso
colocado junto da orelha. Se isto falhar, pode-se afoga-lo ou imobiliza-lo
deitando água no ouvido. Por vezes é possível retirar objectos estranhos dos
ouvidos utilizando apenas água. Contudo, se o objecto é dos que incham quando
molhados, tais como sementes ou pedaços de madeira, não se deve colocar água
nos ouvidos.
De um modo
geral, a inspecção do nariz comprimirá ainda mais o corpo estranho. Pode-se
provocar desta forma uma lesão nas fossas nasais. Tenta-se remover o objecto
soprando suavemente pelo nariz. Se não resultar, deve-se procurar ajuda médica.
Tratamento
de feridas que requerem sutura
Nas feridas
profundas, é imprescindível a limpeza com água limpa abundante e sabão, para
remover restos de terra e corpos estranhos juntamente com coágulos e restos de
sangue. É provável que ao remover coágulos se reabram bocas vasculares e
origine novamente sangramento, o que obriga à colocação de um penso
compressivo, só que desta feita sobre uma ferida mais limpa.
Numa ferida
profunda é importante avaliar o movimento, a circulação e a sensibilidade para
confirmar que não existe afectação muscular, tendinosa, vascular nem nervosa.
Para se conseguir uma boa hemostasia numa situação de urgência será suficiente
aplicar uma compressão adequada. Não é conveniente proceder à sutura de uma
ferida profunda, se esta não for bem explorada para despistar lesões arteriais
e nervosas, que podem passar despercebidas fora de um ambiente cirúrgico.
Após esta
avaliação, o pessoal não sanitário pode unir os bordos da ferida com pontos de
borboleta, que são tiras de papel
adesivo, específicas para unir os bordos das feridas e que se deixam colocadas
por um período de uma semana aproximadamente.
O pessoal que
efectua o resgate e com conhecimentos e
experiência pode efectuar a sutura mediante a seguinte técnica:
. Se a
ferida é limpa e tem menos de 6 horas de evolução, sutura-se directamente. Se
tem mais de 6 horas, terá que ser tratada por especialistas que decidirão se
aplicam sutura ou não, e em caso afirmativo cortará os bordos da ferida antes
de a suturar.
. Anestesia
local. Utiliza-se uma agulha fina, coloca-se o bisel da agulha em posição
horizontal em relação à pele e após fazer uma pequena aspiração, para verificar
que a agulha não está no interior de nenhum vaso sanguíneo, infiltra-se
anestésico provocando uma pequena pápula dérmica. Infiltração anestésica “em diamante” com duas
secções em ambos os vértices, introduzindo a agulha por um deles e injectando
pequenas quantidades de anestésico à medida que se avança, sendo que ao extraír
a agulha se injecta maior quantidade. Ao chegar ao ponto de entrada e sem
extraír a agulha, muda-se a direcção desta para infiltrar do outro lado.
Seguidamente repete-se a mesma técnica na secção do outro vértice.
. Limpeza da
ferida com iodopovidona de dentro para fora.
. Exploração
da ferida
. Sutura
Eleição do
fio de sutura:
. Para a
cara: fio 5-6/0.
. Para o
couro cabeludo: fio 2-3/0.
. Para o tórax
e costas: fio de 3-4/D.
. Para os
membros superiores: fio 4-5/0.
. Para os
membros inferiores: fio 4/0.
. Para o
tecido celular subcutâneo: vicril ou dexon 3-4/0.
Técnica de
sutura:
. Fechar
primeiro os planos profundos para não deixar cavidades livres onde se
acumulariam hematomas que se poderiam infectar.
. De
seguida, suturar a pele com o menor número de pontos. O nó deve ser apertado
até que os lábios da ferida iniciem o contacto. De seguida faz-se um nó em cada
lado da ferida, de forma a evitar que se exerça demasiada pressão no nó, já que
poderia originar uma área de isquemia e
progredir para uma infecção local.
Tempo
necessário para retirar os pontos:
. Da cara:
4-5 dias.
. Do nariz:
3-5 dias.
. Do
escalpe: 7 dias.
. Das
extremidades: 10-12 dias.
. Do tronco:
6-14 dias.
. Efectuar
profilaxia anti-tetânica se for necessário.
. Colocar
uma compressa e ligadura.
Podem
existir, no entanto situações, em que as
equipas de resgate demoram demasiado tempo, devido ao difícil acesso até à
vítima ou mesmo devido a más condições meteorológicas, ou ainda locais onde não
existam equipas de resgate. Nestes casos o socorrista/montanheiro, com um
mínimo de conhecimentos poderá efectuar uma sutura, mas apenas em casos de
extrema necessidade.
Quando a
ferida é muito profunda e as suturas em borboleta não são suficientes, deve
suturar-se a ferida. Quando uma ferida é fechada, não devem existir bolsas de
ar ou sangue debaixi da pele (A). É necessário um instrumento para segurar a
agulha (um fórceps com um encaixe para agulhas) e material de sutura.
Suturar é
simplesmente coser. Quando se estiver a coser cada um dos pontos deve-se ir até
ao fundo da ferida (B) para evitar o aparecimento de bolsas (C) e para apanhar
quantidades iguais de tecido de cada um dos lados da ferida de modo a alinhar
os bordos desta (D). Para uma sutura mais segura, atam-se com um nó torto.
Dá-se uma laçada sobre o instrumento que
segura a agulha (A), agarra-se o extremo através da laçada (B), aperta-se (C),
dá-se uma volta em torno do instrumento que segura a agulha no sentido oposto
(D), agarra-se o extremo através da laçada (E) e aperta-se bem (F). deixa-se
que os pontos se mantenham por um período de 10 dias e então removem-se com o
auxilio de uma tesoura de pontas finas. Agarra-se o nó com o fórceps e as pinças e puxa-se o ponto
com um puxão firme.
Não será
necessário relembrar que qualquer uma destas situações acarrecta vários riscos
e algum sangue frio. Portanto não se esqueçam de frequentar um curso de
primeiros socorros antes de colocar em práctica qualquer um destes métodos.
Boas
caminhadas…
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