O Frio
Regulação térmica
A temperatura do corpo humano é, normalmente, de 37ºC. O
corpo humano quando nu, apenas consegue manter esta temperatura constante se a
temperatura ambiente estiver acima dos 28ºC. Abaixo desta temperatura,
dependerá da roupa e dos abrigos, para se isolar do ambiente e reduzir a perda
de calor. A hipotermia já pode representar um perigo quando a temperatura
ambiente está abaixo de 15,5ºC.
Em repouso, o corpo humano produz entre 40 e 60 kcal de calor
por m2 de superfície corporal. O movimento e as tremuras corporais podem
aumentar a produção de calor de 2 a 5 vezes mais.
Formas de combater o
frio
Um dos problemas mais prementes no montanhismo invernal é
mantermo-nos secos e confortáveis. Fazer uma caminhada, esquiar ou inclusive
andar sobre a neve, constituem actividades extenuantes, e enquanto estivermos
em movimento, manteremos a temperatura e inclusive sentiremos calor. No
entanto, quando pararmos para descansar arrefeceremos rapidamente. Muitos
especialistas dizem que se deve evitar suar no inverno porque a humidade empapa
a roupa, o que acaba por nos gelar. Tudo isso está correcto, mas não é fácil
dizer ao nosso corpo que não sue quando nos esforçamos para subir uma
inclinação na montanha com uma pesada mochila nas costas. É melhor procurar
equilibrar a produção e a perda de calor, usando adequadamente os fechos
(zipper), abrindo-os para ventilar quando estamos quentes e vestindo mais roupa
quente e que melhor nos proteja do vento, quando pararmos para descansar, caso
contrário podemos gelar em questão de minutos.
O maior problema é mantermo-nos secos. Se estiver a nevar,
será melhor usar roupas com a superfície lisa, como o nylon, onde os flocos de
neve resvalem, antes de terem tempo de derreter. Convém sacudir a neve que se
comece a acumular na roupa e ter atenção para que quando comece a derreter, não
nos molhe as calças. Também é aconselhável, antes de passar por debaixo de
árvores, dar-lhe uma pancada para evitar que nos caia um pedaço de neve em
cima. É bom comer muitos hidratos de carbono enquanto caminhamos. O chocolate,
os doces e os caramelos e rebuçados ajudam-nos a conservar o calor e a energia.
O vento
É preciso ter muito em atenção o vento. Ainda que esteja
relativamente pouco vento, este produz um arrefecimento no corpo, porque remove a pequena camada de ar quente
que o envolve e protege. Se o vento aumentar até à velocidade de 64 km/h, tem o
efeito de baixar a temperatura corporal, sendo que acima desta velocidade o
efeito adicional se revele escasso, na medida em que já arrefecemos bastante
anteriormente. As temperaturas baixas por si só, não constituem um problema, se
estivermos vestidos adequadamente e não pararmos de nos movimentar. No entanto
se levantar vento, a temperatura efectiva será muito mais baixa que a
temperatura real do ar.
O resfriamento
O resfriamento, ou mais correctamente, a hipotermia, ocorre
quando as condições climatéricas são frias e húmidas. Ao esfriar o corpo, verifica-se
a redução da circulação do sangue na pele e nas extremidades, o que constitui
uma reacção natural ao corpo de forma a manter-se a temperatura necessária nos
órgãos vitais. A parte central do corpo tem que estar a uma temperatura
constante (que em condições normais é de 36,9ºC) e conservar esta temperatura é
fundamental.
Se a temperatura da parte central do corpo desce, tal
situação começará por originar um deterioramento mental, a perda de controle
muscular, a inconsciência e finalmente a
morte. Na montanha, dificilmente se morre apenas de frio. Mas quando a este se
junta o esgotamento das reservas de energia, ou simplesmente com o cansaço, o
corpo revela-se incapaz de manter a temperatura estabilizada, o que determina o
surgimento da hipotermia. É fundamental conservar as nossas reservas de energia
quando está muito frio, vento e humidade.
A sobrestima da forma física e a subestima do tempo que seja
necessário para chegar a um ponto de destino, são duas causas secundárias,
ainda que frequentes da hipotermia. Outra causa é a dieta alimentar inadequada.
O corpo humano é como uma máquina e necessita constantemente de combustível
para continuar a funcionar. Quanto mais esforçarmos o nosso corpo, de mais
combustível necessitamos, sendo que durante uma caminhada dura no inverno, as
nossas necessidades energéticas podem alcançar as 7.000 calorias diárias, ou
mesmo mais. No nosso equipamento devem constar elementos altamente energéticos
que se possam comer enquanto caminhamos. Nem sempre é fácil avaliar se temos um
caso de hipotermia “entre mãos”. É ainda mais difícil avaliar quando somos nós
próprios as vítimas. Devemos observar os nossos companheiros e pedir-lhes para
nos observarem a nós. Se suspeitarmos que surgem os primeiros sintomas de
hipotermia, talvez sejamos capazes de evitar uma crise posterior. Uma vítima de
hipotermia, apresenta, geralmente, sintomas de dificuldade nos respectivos
movimentos e na sua atitude. Um comportamento irracional e queixas de frio e
fadiga, podem ser sinais de que se inicia a hipotermia. É provável que o
afectado comece a tremer, a tropeçar, a falar com a voz trémula, a ter súbitos
arranques de energia ou a responder agressivamente aos conselhos para deixar de
caminhar e se resguardar. Convém ter presente que quando as condições são difíceis,
os elementos do grupo devem permanecer sempre juntos e vigiarem-se entre si.
Têm que estar sempre alerta.
Logo que se notam os sintomas, deve-se parar. Se a vítima
desmaia será necessário procurar ajuda, porque a situação é grave. É
fundamental manter a temperatura central do corpo. Tendo isto bem presente, é
uma necessidade dar calor à superfície das extremidades corporais para que o
sangue circule nelas, porque é necessário que o sangue circule pelo centro do
corpo. A nossa primeira preocupação será resguardar a vítima dos elementos e
utilizar todos os meios disponíveis para manter a temperatura estável nas
partes do corpo. Depois deverá procurar-se que a vítima volte a aquecer. Se esta
estiver molhada deve-se retirar a roupa, secar seu corpo (sem o esfregar), metê-la
num saco cama previamente aquecido e montar uma tenda para ser utilizada como
refúgio. Um saco cama que apenas se desenrola e que esteja frio, não será de
grande utilidade, pois a vítima não terá temperatura corporal para o aquecer.
Se um companheiro não afectado por
hipotermia, se enfiar com ele no saco
cama, poderá ajudar a fornecer-lhe algum calor adicional. Deve-se isolar o saco
cama do solo, com o recurso a uma esteira, uma tenda ou um saco de bivaque. Se a
vítima conseguir comer, devem-se dar-lhe apenas doces e bebidas temperadas, mas
não quentes, para que as tome em pequenos goles. Nunca se deve forçar uma
pessoa inconsciente a beber álcool. Neste estado de hipotermia, a quantidade de
sangue que chega ao estômago é tão limitada que este não consegue digerir
alimentos fortes. Até que chegue ajuda, deve-se manter a vítima agasalhada,
confortável e imobilizada, e isto mesmo que esta insista em continuar a
caminhar.
Mecanismos responsáveis
pela perda de calor
O calor pode-se perder através de diversos mecanismos:
. Radiação – O calor perde-se por transferência
directa para o ambiente. A perda de calor por radiação depende da superfície
exposta e da diferença de temperatura entre o corpo e o ambiente. Quanto mais
frio for o ambiente mais superfície corporal fica exposta e portanto, mais
calor se perde. Em ambiente seco, a radiação é a causa mais importante de perda
de calor (55% a 65%). Aproximadamente 30% do calor, perde-se pela cabeça e pescoço.
A roupa evita que o calor se perca tão rapidamente. A lã é um bom isolante e
conserva as suas propriedades, mesmo quando está molhada. O algodão perde as
suas propriedades quando está húmido. Em tempo frio deveríamos colocar 3 ou 4
camadas de roupa seca. Em caso de emergência pode ser útil envolvermos o corpo
com 14 ou 15 camadas de papel de jornal.
. Convecção – O ar em contacto com a pele aquece-se
até alcançar a temperatura da mesma. Quando o ar aquecido se movimenta e afasta
do corpo, chega em seu lugar ar frio que por sua vez, também deverá aquecer.
Como o calor necessário para aquecer esse ar frio provém da pele, o corpo vai
perdendo calor. As maiores perdas de calor por convecção têm lugar quando o ar
está em movimento (vento). O calor corporal perde-se quando os espaços que
aprisionam o ar dentro da roupa estão submetidos ao efeito do vento. O ar
acumulado no tecido e nos espaços existentes entre as diferentes camadas de
tecido armazenam o calor produzido pelo corpo. O vento substitui este ar quente
por ar frio. Quando a temperatura do ar
é superior à corporal, o corpo ganha calor. A quantidade de calor subtraída
pelo vento aumenta de forma proporcional ao quadrado da velocidade e não em
proporção directa desta, (por exemplo; o vento a 12 km/h extrai uma quantidade
de calor quatro vezes superior a outro vento de 6 km/h e não o dobro). A perda
de calor por convecção pode-se reduzir com uma camada de roupa exterior que
impeça a passagem do vento (Windstopper, Goretex, Sympatex e fibras similares).
A -30ºC as partes do corpo expostas ao vento podem congelar num minuto e a -60ºC, em 30 segundos.
Qualquer que seja a velocidade do vento, o risco de congelação é pequeno se a
temperatura ambiental for superior a -10º, sendo alto esse risco quando a
temperatura ambiental for inferior a -25ºC.
A velocidade do vento pode ser estimada por uma série de
observações:
. 16 km/h: sente-se o vento na cara.
. 32 km/h: movem-se as ramas pequenas das árvores e
levanta-se a neve solta e o pó.
. 48 km/h: movem-se os
ramos grandes das árvores.
. 64 km/h: move-se toda a árvore.
. Condução – O calor corporal perde-se através do
contacto com algo frio, como por exemplo água, metal, rochas, etc. A imersão em
água fria pode aumentar a perda de calor por condução de 25 a 32 vezes em
comparação com o ar, e o aço ainda o aumenta mais. Geralmente a perda de calor
por conductividade é cerca de 2% da perda total. Mas com roupa húmida, esta
perda pode-se multiplicar por 5. Dormir no chão sem um isolante adequado
aumenta a perda de calor por condução.
As esteiras de espuma oferecem um isolamento maior do que as colchonetes
de ar, pois estas permitem a livre circulação do ar.
. Evaporação – Consiste na transformação da água do
seu estado líquido para o estado gasoso (vapor). Quando a água se evapora leva
o calor com ela. A evaporação é responsável pela perda de 30% do calor.
A evaporação da água do corpo pode ocorrer através do ar
expirado (que contém água), ou através da pele (perspiração ou transpiração). A
transpiração pode ser sensível, quando damos conta dela (sudoração), ou
insensível, quando ocorre sem darmos conta (perspiração insensível).
Sudoração - o corpo sua (transpiração) para eliminar o excesso de calor. O calor
corporal perde-se pela evaporação da humidade na superfície da pele, por isso é
importante que a roupa não esteja húmida de suor. A roupa húmida pode ser
responsável por perda de calor por evaporação, condução, convecção e radiação. Será
portanto, aconselhável vestir várias camadas de roupa, pois deste modo podemos
agasalhar-nos ou arrefecer com maior facilidade, segundo as necessidades,
colocando ou retirando roupa do corpo.
Perspiração insensível - O corpo também transpira para manter um nível de humidade
de cerca de 70% perto da pele. Num ambiente frio e seco isto pode originar uma
importante perda de calor.
Respiração - Quando respiramos, o ar frio e seco aquece-se e humidifica-se
através da humidade que se evapora pelas vias aéreas, o que implica uma perda
de calor por evaporação.
Entre os factores responsáveis pela
perda de calor, incluem-se: a falta de condição física, o vento, as
temperaturas baixas e a humidade causada pela chuva, pela neve ou pelo suor.
Radiação: Se estivermos com a cabeça
descoberta, pode-se perder mais de 50% do calor corporal que produz a 4,4ºC, e 75% a -15ºC.
Condução: ao tocar objectos frios ou
ao sentar na neve ou em pedras.
Convecção: o movimento do ar, ainda
que seja imperceptível, rouba-nos o calor corporal. As temperaturas com vento,
são drasticamente mais baixas do que sem vento.
Evaporação: Mais conhecido por suor.
É conveniente ventilar a roupa sempre que seja possível, durante os períodos de
muito gasto energético.
Respiração: perde-se calor, pelo ar
que se expira.
Mecanismos orgânicos
de adaptação às mudanças de temperatura
. Vasodilatação – A dilatação dos vasos sanguíneos
aumenta a perda de calor quando a temperatura ambiental é inferior à
temperatura corporal. A máxima vasodilatação pode aumentar o fluxo sanguíneo
cutâneo até 3.000 ml/minuto (normalmente situa-se entre 300 e 500 ml/minuti).
. Vasoconstrição -
O estreitamento dos vasos sanguíneos diminui a perda de calor. A máxima
vasoconstrição pode diminuir o fluxo sanguíneo até 30 ml/minuto.
. Vasodilatação induzida pelo frio – quando a mão ou o
pé arrefecem a 15ºC, surge a máxima vasoconstrição e portanto o fluxo de sangue
que chega a estas extremidades, reduz-se ao mínimo, arrefecendo-as. Se o
arrefecimento continuar até aos 10ºC, interrompe-se a vasoconstrição, por
períodos de 5 a 10 minutos de vasodilatação, que aumenta o fluxo sanguíneo e o
calor que chega às extremidades. A exposição repetida do corpo ou de parte dele
à água fria, por exemplo, umas 15 vezes, pode aumentar esta resposta e fornecer
um certo grau de aclimatação.
. Sudoração – A evaporação do suor arrefece o corpo.
. Tremuras – Elas geram calor através do aumento das
reacções químicas exigidas pela actividade muscular. A tremura pode aumentar a
produção de calor em cerca de 500%. Este mecanismo está limitado a poucas horas
devido ao esgotamento da glicose muscular consumida ao produzir a contracção do
músculo que treme com o consequente aparecimento da fadiga.
. Aumento e diminuição da actividade física - Pode
aumentar ou diminuir a temperatura.
. Respostas comportamentais – O nosso cérebro, em
princípio, estimula-nos a colocar ou retirar a roupa de acordo com as
necessidades do organismo.
Hipotermia
Conceito
A hipotermia acidental define-se como a descida da
temperatura central do corpo até níveis em que as funções musculares e
cerebrais deixam de funcionar adequadamente (abaixo de 35ºC de temperatura
central, medida no tímpano ou no recto a 10 cm do esfíncter anal. Se a
temperatura central estiver abaixo de 24ºC, é preferível usar um termómetro
transesofágico).
Em função da temperatura central, a hipotermia pode-se
classificar em vários graus:
. Hipotermia grau I (35ºC a 32ºC): a vítima está consciente,
com arrepios.
. Hipotermia grau II (32ºC a 28ºC): baixo nível de
consciência, sem arrepios.
. Hipotermia grau III (28ºC a 24ºC): inconsciente.
. Hipotermia grau IV (24ºC a 15ºC): morte aparente.
. Hipotermia grau V (<15 9="9" hipotermia="hipotermia" irrevers="irrevers" morte="morte" ou="ou" por="por" span="span" vel.="vel.">15>
O tempo aproximado de sobrevivência em água fria é o
seguinte:
. 0ºC: 10 minutos.
. 5ºC: 30 minutos.
. 10ºC: 1,5 hora.
. 15ºC: 6 horas.
Condições que
favorecem a hipotermia
. Temperatura fria: Uma pessoa enterrada debaixo de uma
avalanche, arrefece 3ºC por hora.
. Altitude: A temperatura exterior diminui 0,5ºC por
cada 100 metros de altitude.
. Vento: Pode multiplicar por 10 o efeito do frio.
. Húmidade: pode multiplicar por 14 o efeito do frio.
. Equipamento inadequado.
. Fadiga.
. Desidratação.
. Fraca ingestão de alimentos energéticos.
. Desconhecimento da hipotermia, pois nem a vítima nem
os seus companheiros a detectam, nem sabem como a tratar.
. Ingestão de álcool.
Sintomas e sinais de
hipotermia
Quando o corpo começa a arrefecer, tem início uma fase de
luta com o aumento da produção de calor (tremuras, etc) e descida da perda de
calor (constrição dos vasos sanguíneos, etc). Por volta dos 33ºC a produção de
calor cessa, e posteriormente falham os mecanismos que evitam a perda de calor,
auto mantendo-se a hipotermia ao redor dos 30ºC.
Para classificar correctamente a hipotermia, pode-se utilizar
a seguinte árvore de decisão:
Prevenção
O melhor “tratamento” consiste na prevenção, com o recurso ao
uso de roupa seca e estanque, assim como uma boa hidratação e ingestão de
hidratos de carbono, tomando-se bebidas quentes e açucaradas.
. A roupa deve constar de várias camadas que eliminem o suor
e protejam do vento e da precipitação.
. A camada interior deve eliminar o suor e a humidade,
mantendo a pele seca e retendo o calor, para o que se deverá utilizar, por
exemplo, camisolas de fibra como polipropileno, thermastat, coolmax, etc.
. A camada exterior deve isolar do vento, neve e chuva,
permitindo não obstante, a eliminação do suor. São exemplos de isolantes, o
Goretex, Sympatex e outras fibras similares.
. As camadas intermédias devem reter o calor gerado pelo
corpo e permitir eliminar a humidade, por exemplo, Forro Polar ou das roupas
com fibras artificiais ou Duvet.
. Não esquecer de levar alguns pares de meias. Relativamente
às meias, pode-se utilizar a mesma filosofia que a roupa por camadas.
. Já falamos disso, mas convém lembrar que a lã é um bom
isolante e conserva as suas propriedades, mesmo quando está molhada, no entanto
o algodão perde as suas propriedades quando está húmido.
. É conveniente remover alguma roupa antes de realizar
exercício intenso, ainda que isso represente sentir algum frio no início, para
evitar molhar a roupa com o suor, uma vez que este humedece a roupa e diminui
muito a sua capacidade isolante e por sua vez ainda aumenta as perdas de calor
através da evaporação. Quando se descansar, convém vestir roupa seca e
agasalharmo-nos, antes que chegue o frio, porque então será necessário muito
mais calor para voltar a aquecer o corpo.
. Deve-se levar um gorro de cor clara, que proteja tanto do
Sol como do frio, pois 20% ou 30% do calor perde-se pela cabeça.
Tratamento
Recomendações gerais que se devem seguir em qualquer graú de hipotermia:
Protecção contra o frio:
. Para evitar um colapso por reaquecimento, inicialmente
deve-se aquecer o tronco, e não a periferia do corpo, pelo que não se deve
expor a vítima a calor extremo. Deve-se evitar aquecer as áreas congeladas, até
que a temperatura central do corpo seja de aproximadamente 36ºC.
. Transportar a vítima para um ambiente aquecido que
proporcione um isolamento efectivo (local com temperaturas de 23 a 30ºC). Deve
utilizar-se um saco cama previamente aquecido por outra pessoa e mantas de
salvamento. Desta forma pode-se ganhar 0,1 a 0,7ºC por hora.
. Isolar do solo.
. Proteger do vento.
. Agasalhar a vítima com roupa seca e quente. Retirar-lhe a
roupa húmida. Se não houver roupa seca, pode-se escorrer a roupa o melhor
possível. Se não houver outra solução para a vítima a não ser continuar com a
roupa molhada, pode-se cobrir esta com um tecido impermeável de forma a
diminuir o arrefecimento por evaporação.
. prevenir a perda de calor e aquecer gradualmente a vítima
enquanto é transportada para o hospital.
. Colocar sacos de água quente, ou sacos produtores de calor
tipo Heat Wave (que conseguem manter 38ºC durante 6 ou 10 horas), na cabeça,
pescoço, axilas, lados do tórax e isolar para evitar a perda de calor. Não se
devem colocar as fontes de calor directamente sobre a pele para não a lesar, envolvendo-as
com algum tecido. Desta forma ganha-se 1
a 4ºC por hora. No entanto existe o risco de originar colapso por superaquecimento.
. Os banhos ou duches quentes implicam grande risco de
colapso por superaquecimento, pelo que apenas são aconselháveis na hipotermia
ligeira, quando a vítima está consciente e a temperatura é superior a 35ºC.
. Não esquecer de cobrir a cabeça e o pescoço da vítima.
. Para prevenir que piore a hipotermia, durante os resgates,
tem-se utilizado aquecedores de carvão (Heatpac) com a finalidade de manter a temperatura
corporal. Trata-se de uma pastilha de carvão que ao acender-se liberta calor,
de seguida coloca-se o carvão num pequeno aquecedor dotado de um pequeno
ventilador que distribui o calor por uns tubos de tela que se colocam em volta
do corpo da vítima.
Hidratação
. Desde que a vítima consiga beber, deverá dar-se-lhe bebidas
quentes e açucaradas, se for possível de 15 em 15 minutos. Isto é importante
quando a evacuação da vítima está atrasada.
. Não dar álcool, pois como este é vasodilatador, aumenta a
perda periférica de calor.
. Não dar café ou chá, pois como são diuréticos aumentam a
desidratação.
Outras medidas terapêuticas
. Não dar tabaco, pois sendo um vasoconstritor, aumenta o
risco de congelação.
. Tratar as lesões concomitantes. Devem-se imobilizar,
fazendo-o cuidadosamente para não produzir lesões adicionais nos tecidos
congelados.
. Movimentar a vítima com muita suavidade, se possível na
posição horizontal e sem manipular as extremidades, pois existe um risco enorme
de colapso por superaquecimento. Ao aquecer a periferia (pele, mãos e pés),
aumenta a necessidade de oxigénio para estas zonas. A capacidade de bombear do
coração, ao estar deprimido pela hipotermia, não consegue levar todo o sangue
bem oxigenado que se necessita, para compensar este aumento do consumo de
oxigénio. Além disso, a dilatação dos vasos sanguíneos periféricos que resulta
do aquecimento provoca uma recirculação de sangue frio da periferia para as
vísceras, arrefecendo-as. Isto implica descida da temperatura central do corpo
que pode culminar numa arritmia cardíaca grave (fibrilação ventricular) e,
eventualmente, na morte. Por esse mesmo motivo, se for necessário retirar a
roupa da vítima, deve-se fazê-lo com o máximo cuidado, sendo o melhor método, o
de cortar a roupa para a retirar sem mover demasiado a vítima.
Tratamento da
Hipotermia em função do seu Grau
Em casos de hipotermia, o montanheiro “normal” pouco poderá
fazer, pelo que o que se transcreve a seguir será o socorro efectuado pelas
equipas de resgate especializadas.
Hipotermia de Grau
I
. Transportar ao hospital, se a evolução não for boa com as
recomendações gerais.
Hipotermia de Grau II
. Se prevemos um atraso na evacuação, deve-se colocar uma via
venosa e fazer perfusão de soro fisiológico.
. Transportar para um hospital que disponha de unidade de
cuidados intensivos.
Hipotermia de Grau III
. Se existem reflexos de protecção da via aérea (nariz e
boca), colocação de uma via venosa e perfusão de soro fisiológico . O início da
terapia intravenosa não deve atrasar o transporte da vítima para o hospital.
. Se não existem reflexos de protecção da via aérea, deve-se
fazer entubação endotraquial .
. Transportar a um hospital com unidade de circulação
extracorpórea (cirurgia cardíaca), pois é o tratamento de eleição nestes casos.
Nos hospitais de montanha podem-se
realizar lavagens peritoneais, pleurais, perfusões intravenosas a um ritmo
prudente com soros aquecidos, ventilação respiratória com ar quente e inclusive
hemodiálises (rim artificial) com líquidos quentes, no entanto estas medidas
apenas servem para limitar o agravamento enquanto a vítima é transportada para
um hospital com circulação extracorpórea.
Hipotermia Grau IV
. Se não houver pulso carotídeo, depois de avaliar por um
período de 45 segundos, deve-se iniciar de imediato a reanimação cardio-pulmonar
(RCP). Convém saber que o pulso radial fica ausente abaixo de 33ºC e a dilatação pupilar não tem
valor como prognóstico nos hipotérmicos. A insuflação de ar realiza-se pelo
método boca-máscara com a finalidade de insuflar ar quente.
. Colocação de uma via venosa e perfusão de soro fisiológico.
A maioria dos hipotérmicos estão desidratados e podem necessitar da perfusão de
fluídos. Pode-se começar administrando
10 cc/kg de soro fisiológico ou glucosalino, seguidos de 5 cc/kg/hora em
perfusão contínua. O soro Ringer não é recomendado devido à incapacidade do
fígado hipotérmico para metabolizar o lactato. Seria necessário aquecer os
soros a 43 – 45ºC, sendo que um estudo clínico demonstra vantagens, aquecendo-o
a 65ºC em caso de hipotermia grave.
. Haverá que estar bem atento, nestas situações, ao modo de
administração de fármacos: devido ao retardamento do metabolismo no
hipotérmico, os fármacos administrados em doses normais podem resultar tóxicos
quando a vítima retoma a temperatura normal, por isso é aconselhável
administrar doses mínimas e dobrar o
tempo entre a administração de doses.
. Entubação endotraquial: no paciente hipotérmico, a entubação
é arriscada, pois pode provocar fibrilação ventricular (arritmia grave), por
esse motivo, apenas a poderá efectuar, pessoal muito especializado e treinado e
se realmente a via aérea estiver comprometida.
. A oximetria de pulso (medição da saturação de oxigénio
através de um aparelho chamado oxímetro) pode não ser fiável, devido à
vasoconstrição. Deve ser considerado o salicilato de metilo tópico, como
vasodilatador. Se for administrado oxigénio, deve ser efectuado com ar quente
(40 ou 42ºC) e humidificado, se possível.
. Medição da temperatura:
- Se a temperatura for superior a 32ºC e a RCP for eficaz,
deve-se providenciar o transporte da vítima para o hospital.
- Se a temperatura estiver entre 32ºC e 15ºC, deve-se
utilizar o electrocardiograma, se for possível.
- Se for verificada fibrilação ventricular, ou assistolias,
sem presença de asfixia, convém saber que a desfibrilação é ineficaz abaixo de
28ºC. Pode-se efectuar uma descarga eléctrica de prova a 360J. As arritmias
podem surgir abaixo dos 30ºC, sendo que
a máxima susceptibilidade se encontra perto dos 22ºC. A Lidocaína é ineficaz
nas arritmias induzidas por hipotermia. Alguns especialistas recomendam a
administração de Bretílio (5 mg/kg inicialmente seguidos de 10 mg/kg se for
necessário) de forma profiláctica. Quando a vítima está acima dos 28ºC ou se
for desconhecida a sua temperatura, deve-se tratar como se fosse um
normotérmico. Enquanto esteja abaixo de 28ºC deve-se utilizar continuadamente o
desfibrilador depois da descarga inicial.
- Se apresentar assistolias com asfixia, (como sucede, por
exemplo, na presença de uma boca cheia de neve provocada por uma avalanche) ao
chegar ao hospital, deve-se administrar determinação analítica de potássio
sanguíneo, pois tem uma boa correlação com a sobrevivência, excepto em casos de
lesões por achatamento. Se for superior a 12 mEq/litro, pode, desde logo,
emitir-se o diagnóstico de falecimento por asfixia com hipotermia secundária. No
entanto se for inferior, é possível a recuperação.
- Se a temperatura for inferior a 15ºC, pode-se emitir o
diagnóstico de falecimento.
. Transportado para um hospital com unidade de circulação
extracorpória, por ser o tratamento de eleição nestes casos.
. Métodos de aquecimento e ganho de calor:
Complicações mais
frequentes:
1 – Arritmias.
2 – Desidratação
3 – Hiperpotassemia (aumento do potássio sanguíneo)
4 – Hiper ou hipoglissemia.
5 – Distúrbios do equilíbrio ácido-base.
Por tudo quanto se expôs, podemos
verificar que o frio acarreta imensos e graves perigos, pelo que devemos tomar
todas as precauções quando nos deslocamos para a montanha. O tempo na montanha
é sempre imprevisível, mas sempre podemos atenuar o perigo consultando a
meteorologia que se encontra ao dispor, e nunca esquecendo que a prevenção é
sempre melhor que o tratamento. Relativamente a este tema da temperatura ainda
iremos publicar uma 3ª parte, pelo que se devem manter atentos. Até lá…
Boas caminhadas
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