Poucos montanheiros morreram até
aos dias de hoje por efeito dos raios da
trovoada, razão pela qual estatísticamente, é pouco provável que nos caia um em
cima. O motivo porque se inclui este tema no nosso blog, é o de procurar evitar
que a lei da probabilidade se constitua na nossa única defesa contra os raios.
Na verdade, devido a representar um perigo muito residual para os praticantes
de montanhismo, este tema acaba por ser amplamente ignorado, pelo que esperamos
que a presente abordagem possa contribuir, sobretudo na vertente da prevenção,
num factor relevante para reforçar a improbabilidade de assumirmos o
“desconfortável” papel de para-raios.
Os raios, bem como por exemplo as avalanches, devem ser considerados como fontes de
perigo potencial e objectivo.
O raio deve-se às cargas
eléctricas presentes na atmosfera, e à electricidade que flui da linha do
denominado menor esforço. Se for produzida uma descontinuidade no
condutor, que é o objecto através do qual circula a electricidade, a corrente
salta no espaço, como acontece nas velas de ignição dos automóveis. Nas
tempestades, as nuvens carregam-se de electricidade, a qual passa para a terra,
através de um fenómeno que gera um flash de luz, escolhendo o caminho mais
curto, pelo que este vai caír, a maioria das ocasiões, sobre o acidente mais proeminente do terreno.
Existem três classes de raios.
A primeira delas ocorre no
interior de uma nuvem, de uma nuvem para outra ou ainda do ar carregado para
uma nuvem. É um fenómeno interessante , mas que não oferece uma ameaça real
para os montanheiros.
A segunda variedade, é a mais
frequente e é apelidada de “ raio descendente” porque o raio transmite-se para o solo terrestre a partir de uma nuvem,
normalmente caindo sobre o ponto mais proeminente de terreno. Estes raios podem
cair directamente sobre alguém, ainda que seja pouco provável, no entanto é
mais usual que originem uma redução da voltagem devido à captação do ar, que
rodeia o corpo, pelo que a pessoa “apenas terá que resistir a uns poucos milhares de voltes ,
derivados da chamada tensão do arco
durante uma fracção mínima de segundo. Ainda que seja suficiente para causar a morte, raramente o é,
e a vítima quase sempre recupera completamente e rapidamente.
Em terceiro lugar temos a classe
dos “raios ascendentes”. Estes têm a sua origem no solo (embora a simples visão
humana não detecte essa inversão) e transmitem-se para as nuvens. Esta classe
de raios apenas se produz no cume das montanhas, pelo que os montanheiros e
escaladores correm um certo risco em relação a eles. Uma pessoa que seja
atingida por um raio ascendente pode sofrer uma descarga de até 300 amperes,
durante várias centésimas de segundo, a uma temperatura superior a 50.000 F. A
combinação da descarga eléctrica e do calor extremo, quase sempre produz uma
paragem cardíaca. É frequente, perante tal tipo de raios, encontrar queimaduras no corpo, e os fechos e
botões metálicos fundidos.
Face a esse perigo real, que
temos que fazer quando nos encontremos no meio de uma tempestade eléctrica?
A não ser que tenhamos muita má
sorte, normalmente apercebemo-nos que se aproxima a tempestade. Provavelmente
escutaremos trovões, ou inclusive sentiremos a electricidade no ar, os pelos
eriçam-se, sentiremos um formigueiro na pele, ou o piolet vibra, poderá soltar
algumas faíscas, ou ficar mesmo com um brilho azulado…
Como os raios costumam cair sobre
os elementos mais altos do terreno, existem zonas que apresentam maiores
probabilidades de serem alcançadas por estes. O local ideal para se estar, será
sempre afastado de qualquer objecto de aço, de cócoras, bem encolhidos, como
que formando uma bola e com os pés
juntos. Se for possível, devemo-nos colocar sobre algo que nos isole do solo,
ainda que seja roupa enrolada, colchonetes para dormir, ou a mochila (tendo o
cuidado que não tenha remates metálicos e ter retirado previamente do seu
interior tachos, fogões, varetas da tenda, etc…).
O nosso objectivo será manter o
mínimo contacto possível com o solo, e estar afastados de riscos que
sobressaiam, como sejam os cumes de montanha, rochas proeminentes, marcos de
pedra, etc…
Não se deve procurar refúgio nos
desfiladeiros, covas pouco profundas, ou debaixo de rochas que sobressaiam no
terreno, porque estas situações tendem a actuar como o espaço de uma tomada
eléctrica, e portanto poderemos sofrer graves queimaduras ou inclusive morrer.
Mas afinal o que é a trovoada?
A trovoada é uma situação
meteorológica caracterizada pela presença de raios, associada ao efeito acústico dos mesmos na atmosfera terrestre,
mais conhecido por trovão.
Para uma trovoada se formar é
necessário que aconteça a elevação de ar húmido numa atmosfera instável. A
atmosfera fica instável quando as condições são tais, que permita que uma bolha
ou massa de ar quente em ascenção possa continuar a subir, na medida em que
esta continua mais quente do que o ar ambiente que a rodeia. (A elevação do ar
quente é um mecanismo que tenta restabelecer a estabilidade. Do mesmo Modo, o
ar mais frio tende a descer e a afundar-se enquanto se mantiver mais frio do
que o ar à sua volta).
Se a elevação de ar for
suficientemente forte, este arrefece até temperaturas abaixo do ponto de
orvalho pelo que condensa, libertando assim calor latente que origina a
elevação do ar e “alimenta” a trovoada. Formam-se então nuvens denominadas
cumulonimbus isolados e com grande desenvolvimento vertical, que são
alimentados pelas correntes ascendentes de ar.
As trovoadas podem-se formar no
interior das massas de ar a partir da elevação do ar por efeito da convecção
(comum em terra, nas tardes de Verão), quando o aquecimento da superfície
atinge o seu pico (e também sobre o mar nas madrugadas de Inverno, quando as
águas estão relativamente quentes), bem como por efeito orográfico (a
barlavento das grandes montanhas) ou estarem ainda associadas à ocorrência de
frentes, sendo neste caso, mais intensas no caso das frentes frias.
As trovoadas mais fortes são
produzidas quando o ar quente e húmido sobe rapidamente, com velocidades que
podem chegar aos 160 km/h, até altitudes mais elevadas e mais frias. Em cada
minuto ocorrem cerca de 2000 trovoadas sobre a superfície da Terra. Os
relâmpagos surgem quando as partículas de gelo ou neve de uma nuvem começam a
cair de grande altitude em direcção à superfície terrestre e correspondem à
libertação de energia devida à diferença de carga entre as partículas.
Qual a origem do trovão?
Os trovões são os ruídos que os
raios fazem quando atravessam o ar.
Durante uma trovoada geram-se
descargas eléctricas desencadeadas para equilibrar a diferença de potencial
entre o topo da nuvem (cargas positivas), a base da nuvem (cargas negativas) e
o solo (carga positiva). A atmosfera funciona como isolador entre a nuvem e o
solo. Quando a energia envolvida numa tempestade ultrapassa a resistência do
ar, gera-se uma descarga entre os polos, de carga oposta. Esta descarga é caracterizada
por um raio com temperaturas elevadas que aquece o ar à sua passagem. O rápido
aumento da pressão e temperatura fazem expandir violentamente o ar envolvente ao
raio a velocidades superiores às do som, gerando-se desse modo uma onda de
choque. O ribombar posterior a um trovão é o resultado do eco da onda de choque
nas altas camadas da atmosfera e na geografia envolvente.
Nas proximidades do ponto de
contacto do raio com o solo regista-se um nível sonoro de cerca de 120 dB. A
proximidade do trovão pode produzir surdez temporária e até mesmo rotura da
membrana do tímpano e consequentemente, surdez permanente.
Como saber a que distância se
encontra a trovoada de nós?
Uma vez que o som e a luz se
deslocam através da atmosfera a velocidades muito diferentes, pode-se estimar a
distância da trovoada através da diferença de tempo entre o relâmpago (luz) e o
trovão (som). A velocidade do som no ar é de aproximadamente 343 m/s. A
velocidade da luz é tão elevada (+- 300.000 km/s) que a transmissão da luz pode
ser considerada instantânea. Ora, multiplicando 343 pelo número de segundos que
se registe entre a visualização do raio e o subsequente escutar do trovão,
obter-se-á a distância da trovoada em metros. Por exemplo: Se a diferença de
tempo entre o raio e o trovão for de 3 segundos, então a distância entre nós e
a trovoada será de 1.029 metros (3 x 343 = 1.029 metros), ou seja,
aproximadamente 1 km de distância.
No próximo artigo, daremos
continuidade a este tema, que embora pouco abordado é de extrema utilidade,
porque na improbabilidade de sermos atingidos por um raio, existem inúmeros
casos de pessoas atingidas por raios na montanha. Portanto prestem atenção às
condições meteorológicas quando se deslocarem para a montanha e criem situações
de defesa.
Até lá…
Boas caminhadas
Lindo, maravilhoso. Util de mais.
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